domingo, 17 de dezembro de 2017

A RESSOCIALIZAÇÃO DOS PRESOS ATRAVÉS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
A importância de fornecer uma educação profissional aos presos enquanto cumprem pena como mecanismo de ressocialização quando egressos do sistema penitenciário.

O presente estudo tem por fim diagnosticar como deve ser conduzido o processo de ressocialização dos presos através da educação profissional dentro do sistema penitenciário brasileiro. A Constituição Federal prevê expressamente a responsabilidade do Estado perante todos os cidadãos, garantindo-lhes direitos e deveres fundamentais, abrangendo também a população prisional que ingressa no sistema penitenciário. A estes condenados, devem ser proporcionadas condições para a sua integração social dentro das penitenciarias, visando a não violação de seus direitos que não foram atingidos pela sentença.

Justifica-se este estudo na busca de indicar para a sociedade e para os presos que o melhor caminho para a reinserção social e profissional dos mesmos está na educação, pois a maioria deles não teve nem a oportunidade de estudar antes de entrar para o mundo do crime.
2.DIREITOS CONSTITUCIONAIS VIOLADOS
Inicialmente o Estado através das penitenciárias materializa o direito de punir todos aqueles que praticam uma infração penal, mas o que se observa é que o sistema prisional não obtém êxito satisfatório no emprego de suas sanções, em virtude da falta de estrutura carcerária que comporte o número cada vez maior de condenados.
Em decorrência desta falta de estrutura, tem-se violado a dignidade humana, e sabe-se que a dignidade humana é denominada fundamental porque trata de situações sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem sobrevive.
A dignidade humana engloba várias outras garantias do texto constitucional como à vida inclusive dos que estão cumprindo pena por terem cometido conduta reprovável em sociedade. De acordo com o Pacto internacional sobre direitos civis e políticos no Art. 2°: “O direito à vida é inerente à pessoa humana. Este direito deverá ser protegido pela lei. Ninguém poderá ser arbitrariamente privado de sua vida.”
Outro direito fundamental violado é a integridade física e moral, descrita na Constituição Federal, Art. 5°, XLIX , no qual de forma expressa assegura o respeito à integridade física e moral aos presos e aos cidadãos. A CF ainda é mais especifica quando garante no mesmo artigo, inciso III: “ Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. A pena prisional deveria restringir apenas o direito de ir e vir visando mais do que a simples sanção diante de um crime praticado, mas a recuperação e a reinserção plena do indivíduo no meio social.
A pena é na realidade uma resposta punitiva estatal de um crime e deve guardar proporção com o mal infligido na sociedade, isto é, deve ser proporcional à extensão do dano. De acordo com Cesare Beccaria (1998, p.162-163): “para que toda a pena não seja uma violência de um ou de muitos contra um cidadão particular, deve ser essencialmente pública, pronta, necessária, a menor possível nas circunstâncias dadas, proporcional aos delitos, fixadas pelas leis.”.
O Art. 5°, XLVI da CF exige a individualização da pena como forma de garantir que a sanção deve ser aplicada de acordo com a gravidade do delito. É de suma importância que o sentimento de vingança de quem foi vítima do delito não se confunda com a proporcionalidade da sanção a ser aplicada, pois qualquer excesso de severidade torna a pena supérflua.
3. Considerações sobre a execução penal no Brasil
A Lei de Execução Penal n° 7.210 de 1984 (LEP), ao ser criada, representou um avanço na legislação, pois passou a reconhecer o respeito aos direitos dos presos e assim previu um tratamento individualizado. Esta lei não visou apenas à punição dos presos, mas também a ressocialização dos condenados.
Acontece que o ambiente carcerário é um meio falido para reabilitar o recluso devido às condições materiais e humanas das prisões que impedem a realização do objetivo reabilitador, e se o ordenamento jurídico possui a LEP como um dos únicos meios legais para cumprir esta função ressocializadora é necessário que esta função seja cumprida no sistema carcerário brasileiro.
3.1 Objeto e aplicação da LEP n° 7.210/84
O Art. 1° da Lei de Execução Penal tem duas finalidades: a primeira é a correta efetivação do que dispõe a sentença ou decisão criminal, “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal”; e a segunda é instrumentalizar os meios que podem ser utilizados para que os apenados possam participar da integração social, “e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. O outro escopo apontado pela lei é promover a reintegração social do condenado.
Segundo Júlio Fabbrini Mirabete (2007, p.32): “A justiça penal não termina com o trânsito em julgado da sentença condenatória, mas realiza-se principalmente na execução”. E a lei de execução foi criada para garantir aos condenados que todos os seus direitos não atingidos pela sentença estariam assegurados e a inobservância desses direitos significaria a imposição de uma pena suplementar não revista em lei.
As formas de assistência aos presos de acordo com o Art. 11 da LEP são: “material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa”, aduz, com este artigo que a reabilitação social constitui uma finalidade do sistema de execução penal e que os presos devem ter o direito aos serviços obrigatoriamente oferecidos pelo Estado dentro das penitenciárias, mas o enfoque maior a ser visto será o enfoque educacional.
O Art. 17 da LEP: “assegura que a assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado”. A educação é tão importante que a própria Constituição Federal no art.205, reza que a educação é um direito de todos e dever do Estado e deve ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa e assim a qualificando para o trabalho.
Segundo Júlio Fabbrini Mirabete (2007, p.120) cita em suas obras: “que a habilitação profissional é uma das exigências das funções da pena, pois facilita a reinserção do condenado no convívio familiar e social a fim de que ela não volte a delinquir.”
É importante considerar que a maioria dos presos hoje são reflexos de uma má educação social, isto é não tiveram oportunidade de frequentar escolas sejam públicas ou até mesmo privadas, e, diante desta realidade, acaba sendo através da delinquência que se constrói suas personalidades, e assim passam a cometer crimes, já que desconhecem o que é moral ou imoral, pois a orientação destes princípios é fundada na educação. É importante salientar que a profissionalização de detentos facilita a reintegração ao mercado de trabalho, pois assim eles aprendem um ofício que poderá ter continuidade quando for egresso do sistema penitenciário.
A Lei de Execução Penal tem a finalidade de recuperar o preso e através do trabalho, estudo e regras básicas de cidadania podendo-se chegar a uma solução tanto para prepará-los ao mercado de trabalho, como para preencher as horas de ociosidade dentro dos presidiários.
3.2 O ócio prisional
A palavra ócio significa horas vagas, descanso e tranquilidade, possuindo também sentido de ocupação suave e prazerosa. Este tempo ociosos o qual faz parte do cotidiano das penitenciárias poderia ser utilizado de forma a oferecer ao condenado condições para o retorno à sociedade através da educação, trabalho e regras de convívio harmonioso dentro da mesma, evitando que eles utilizem este “tempo” para arquitetar novos crimes, alimentar sentimentos de raiva e de vingança para com a sociedade, aliar-se a elementos de alta periculosidade, planejar as rebeliões e fugas dos presídios, assim reincidindo na prática criminosa quando postos em liberdade.
O trabalho e a educação retiram os condenados do ócio, o qual é prejudicial a todo o sistema prisional e a sociedade. O Ex- Ministro Francês André Malraux (2009, on line) dizia: “A esperança dos homens é a sua razão de viver e de morrer”. Daí a importância de educar os presos e garantir uma atividade laboral para que eles saibam que ao reingressarem na sociedade poderão também voltar ao mercado de trabalho de acordo com as funções os quais tiveram oportunidade de se capacitar durante o período em que estiveram recolhidos para cumprimento da pena.
Segundo Domenico de Masi, em sua obra “O ócio criativo”, ele aborda a essencialidade de educar através do tempo livre, isto é através de atividades lúdicas e culturais leva-se ao ócio inteligente, no qual se pode transformar esta ocasião em um momento de crescimento intelectual. Pode até parecer estranho esta analogia no que se refere à vida que se tem dentro dos presídios, mas se realmente fosse adotado a filosofia de ensinar um ofício a estes detentos de maneira que eles pudessem sentir prazer em ler e pensar,de onde poderiam até surgir idéias salutares a serem implantadas dentro da realidade prisional e assim se sentiriam mais úteis.
Diante do exposto percebe-se que estas atividades de educar para pensar também se encontram inseridas dentro da Lei de Execução Penal no Art. 28: “O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva”, no qual será levado em consideração as habilidades e condições pessoais de cada detento para produzir de acordo com sua capacidade física ou mental.
4. A Ressocialização dos presos através do trabalho
No sistema prisional brasileiro as atividades exercidas pelos detentos não configuram uma atividade capaz de formar indivíduos preparados para retornar ao convívio social, pois eles não são educados para adquirir conhecimento técnico necessário à reinserção social. É preciso reorganizar a forma de aplicação do trabalho, devendo alem de ocupar o tempo ocioso, preparar e oportunizar esses sujeitos para escolhas mais conscientes e transformadoras. O estudo e o trabalho devem ser incentivados através de parcerias ou convênios com empresas públicas ou privadas com objetivo da formação profissional dos condenados conforme Art. 34 da LEP. Vale salientar que o estudo é uma atividade laborativa intelectual.
O conceito de ressocialização de detentos, pelo trabalho e pela qualificação profissional, com o propósito de prepará-los ao reingresso social, baseia-se na afirmação de que o trabalho é fonte de equilíbrio na nossa sociedade e também é agente ressocializador nas prisões do mundo todo. Através do trabalho, os indivíduos garantem equilíbrio e melhor condicionamento psicológico, bem como melhor comprometimento social. Ensinar um ofício enquanto cumprem a pena é a maneira mais eficaz para ressocializar os presos.
O Art. 41, inciso II da LEP, dispõe que é direito do preso à atribuição do trabalho e sua remuneração, à jornada de trabalho deve ser igual ou próxima daquela exercida em trabalho livre, assim, não será inferior a seis, nem superior a oito horas conforme estabelece o Art. 33 da Lei de Execução Penal. O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho, segundo o Art. 28, § 2º da LEP, mas deve-se salientar que o trabalho deve ser remunerado, cujo valor não será inferior a três quartos do salário mínimo, e esta remuneração deve atender à reparação do dano causado pelo crime, assistência à família, pequenas despesas pessoais.
A Lei de Execução Penal em seu Art. 34 afirma que o trabalho do preso poderá ser gerenciado por fundação ou empresa pública, com autonomia administrativa e terá por objeto a formação profissional do condenado. O trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviços ou obras públicas realizadas por órgãos da administração direta ou indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra fuga e em favor da disciplina. Para o alcance do benefício do trabalho externo pelo apenado que esteja em regime semi-aberto, deve-se cumprir um sexto da pena que lhe foi imposta.
O trabalho prisional gera ao preso o direito da remissão da pena, isto é, o condenado pode reduzir pelo trabalho o tempo de duração da pena privativa de liberdade. De acordo com a LEP, Art. 126 parágrafo 1°, a cada três dias trabalhado é remido um dia da pena. A remissão é um estímulo para abreviar o cumprimento da sanção e assim alcançar a liberdade condicional ou definitiva. Para Maria da Graça Morais Dias apud MIRABETE (2007, p.517) a remissão trata-se de um instituto completo “pois reeduca ao delinqüente, prepara-o para sua incorporação à sociedade, proporcionando meios para reabilitar-se diante de si mesmo e da sociedade, disciplina sua vontade, favorece a sua família e, sobretudo abrevia a condenação, condicionando esta ao próprio esforço do apenado.”
Ao oferecer uma formação profissional como direito do preso ou como dever do Estado pode-se qualificá-lo profissionalmente, principalmente se o ilícito que levou a cumprir a pena tenha
sido conseqüência de não habilitação educacional ou profissional, pois assim facilita um futuro para o egresso mais favorável a reinserção social, e ainda previne a reincidência.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A verdade é que o Estado não trata o preso como um ser humano, mas como uma coisa. O Estado e a sociedade deveriam se juntar na perspectiva de recuperar aquele indivíduo, já que é sempre possível recuperá-lo. Neste sentido é que existe uma série de mecanismos a disposição do Estado e que devem ser utilizados na busca de ressocializar o preso, porém esses mecanismos de reabilitação do preso, como a educação, atividades laborais que a própria lei de execução penal prevê não são colocadas em prática com a intensidade que deveriam ter e a sociedade, por sua vez, o condena e o exclui, não lhe dando qualquer oportunidade de reabilitação quando ele torna-se egresso do sistema prisional.
De quanto se viu até agora, pode-se deduzir que a cadeia é a verdadeira universidade do crime e a prisão atinge o condenado ou preso em sua integridade física e moral. O ócio que impera nos presídios é o constante convite para aqueles delinquentes de maior gravidade persistir no mundo enganoso do ilícito. A realidade prisional merece sofrer uma transformação, sob pena de perpetuar-se no fracasso a que se destina. Assim, entende-se que o trabalho e a educação de qualidade precisam ser urgentemente inseridos, formal e eficientemente, no interior dos estabelecimentos prisionais, dando uma perspectiva ao recluso que ao cumprir sua pena poderá exercer uma atividade laboral digna na sociedade.
O drama penitenciário é muito preocupante e necessita de ações governamentais urgentes. O trabalho, como fator educativo, se transformaria em lucros sociais, além de reaproximar o sentenciado da sociedade e da sua família.
Educar o homem é a medida mais apropriada e eficaz para o seu progresso e desenvolvimento enquanto indivíduo e ser social. Inserir o homem no mercado de trabalho é proporcionar-lhe as condições para viver dignamente no meio social.
Neste caso, é imperioso que o Estado construa penitenciárias dotadas de bibliotecas, promova palestras e debates, crie postos de trabalhos não apenas para ocupar o tempo do preso, mas para ensinar-lhe uma profissão que propicie seu exercício tão logo readquira sua liberdade. Não parece difícil a aplicação dessas medidas, bastando, para tanto, vontade política dos responsáveis pela implementação de políticas públicas, pois projetos e programas já existem, basta aperfeiçoá-los e colocá-los em pratica.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, Senado, 1988.
BRASIL. Lei n.º 7.210, de 11 de Julho de 1984. Código de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1998.
DE MASI, Domenico. O Ócio Criativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.
MIRABETE, Julio Fabbini. Execução Penal. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2007.


domingo, 26 de novembro de 2017

AÇÃO MONITÓRIA

A ação monitória é um tipo de procedimento judicial especial de cobrança. Para entrar com esse tipo de ação, o credor precisa apresentar contra um devedor uma prova escrita do seu direito.

Por meio de uma ação monitória, o credor pode cobrar o pagamento de uma quantia em dinheiro, a execução de uma ação à qual o devedor havia se comprometido ou a entrega de um bem fungível ou infungível, móvel ou imóvel.
Bens fungíveis são aqueles que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, quantidade e qualidade, como uma geladeira ou o próprio dinheiro. Já os bens infungíveis são, por oposição, aqueles que não podem ser substituídos. São exemplos uma obra de arte e um carro raro de colecionador.

Na prática, a ação monitória é usada principalmente para cobrar cheques e outros títulos já prescritos, como notas promissórias e duplicatas. O prazo de prescrição para entrar com uma ação monitória é de 5 anos, contados do dia seguinte à data em que o título deveria ter sido pago.

A ação monitória deve ser apresentada em uma vara cível, uma vez que a jurisprudência costuma entender que não cabe ao Juizado Especial Cível (JEC) julgar esse tipo de ação.

Vantagens da ação monitória

A ação monitória é um procedimento que já estava previsto na legislação brasileira desde 1995, mas antes não era muito popular. Foi o novo CPC , que entrou em vigor em 2016, que tornou a ação monitória mais atrativa.

Entre as vantagens da ação monitória na comparação com um processo comum está a possibilidade de o credor acelerar o procedimento de cobrança dos seus créditos. Ela funciona como um “atalho” processual, já que, diferentemente do procedimento comum, na ação monitória, o réu é citado para pagamento sem que se realize uma audiência prévia de conciliação.

O devedor pode recorrer da decisão apresentando embargos monitórios, no entanto, em caso de apelação, a cobrança não terá efeito suspensivo automático.

Apresentar uma prova escrita é indispensável na ação monitória. Porém, no caso dos contratos verbais, é possível utilizar também uma prova oral documentada. Para isso, o credor pode, por exemplo, entrar com um processo na Justiça antes da ação monitória visando a produção da prova.






segunda-feira, 20 de novembro de 2017

SERÁ QUE FINALMENTE CUMPRIRÃO O ART. 212 DO CPP? AGORA TEMOS A PALAVRA DO PAI-TRIBUNAL                                                                (Aury lopes Jr)
O mais difícil não é mudar a lei, mas as práticas judiciárias e a cultura, especialmente a inquisitória, ainda tão arraigada no modo de agir dos atores judiciários. O processo penal brasileiro, assumidamente inspirado na matriz fascista do Código de Rocco (basta ler a Exposição de Motivos do atual CPP), estruturou a figura do juiz-ator, ativo na busca da prova, inclusive de ofício (marca indelével de uma estrutura inquisitória, como cansou de advertir Jacinto Coutinho), presidente supremo da audiência e praticamente o gestor da produção da prova testemunhal. Esse juiz-ator-inquisidor, no modelo do CPP, mais do que destinatário da prova, é o verdadeiro "dono" da prova (por exemplo, artigo 156 do CPP). O problema é que isso fere de morte a estrutura dialética do processo (actum trium personarum), pois juiz que vai atrás da prova é um juiz contaminado, que decide primeiro e depois produz a prova que vai justificar sua própria decisão[i]. Lavora em solitário (Franco Cordero) e não na dialética processual-acusatória que se espera, em pleno século XXI, de um juiz penal. Sem falar que o maior prejuízo está na falta de condições de possibilidade de termos um juiz imparcial. A imparcialidade exige do juiz um afastamento, um estranhamento, um alheamento (terzietà) em relação à arena das partes e sua atividade. O juiz é um ser ontologicamente concebido para ser um "ignorante", pois ele ignora as provas e os fatos (isso é a originalidade cognitiva que se espera), sendo essa a condição primeva para termos imparcialidade[ii.
Nessa perspectiva, o modelo de cross examination é uma decorrência natural, ou seja, a prova testemunhal deve ser trazida ao processo pelas partes e submetida ao exame cruzado, perguntas e reperguntas das partes, sendo o juiz o destinatário do produto desse debate. Portanto, o protagonismo é, evidentemente, das partes, e não do juiz, que deve presidir o ato (missão fundamental) e garantir o contraditório. Falar em juiz-espectador, e não mais em juiz-ator, é situar-se na transição do modelo inquisitório para o processo penal acusatório-constitucional, não podendo ser confundido com diminuição da figura do julgador ou em um juiz-samambaia, como já se disse maldosamente alhures, em absurdo reducionismo e incompreensão do que estamos tratando. A imparcialidade exige um afastamento (e uma estética de afastamento) do juiz do espaço de atividade probatória das partes, impondo que efetivamente ele esteja "cognitivamente aberto", livre, disponível para ser convencido pela prova produzida pelas partes.
Essa breve, mas crucial e complexa introdução, serve para situar a discussão feita em torno da "nova" (já se vão mais de nove anos de vigência e polêmica!) redação do artigo 212 do CPP, introduzida pela reforma de 2008. Recordemos:
Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente às testemunhas, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida.
Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição.
A mudança foi muito importante e adequada, para conformar o CPP à estrutura acusatória desenhada na Constituição, demarcando a separação das funções de acusar e julgar e, principalmente, atribuindo a gestão da prova às partes.
Trata-se de atribuir a responsabilidade pela produção da prova às partes, como efetivamente deve ser num processo penal acusatório e democrático. Portanto, o juiz deixa de ter o papel de protagonismo na realização das oitivas, para ter uma função completiva, subsidiária. Não mais, como no modelo anterior, terá o juiz aquela postura proativa, de fazer dezenas de perguntas, esgotar a fonte probatória, para só então passar a palavra às partes, para que, com o que sobrou, complementar a inquirição.
Neste novo modelo, o juiz abre a audiência, compromissando (ou não, conforme o caso) a testemunha, e passa a palavra para a parte que a arrolou (MP ou defesa). Caberá à parte interessada na produção da prova efetivamente produzi‑la, sendo o juiz — neste momento — o fiscalizador do ato, filtrando as perguntas ofensivas, sem relação com o caso penal, indutivas ou que já tenham sido respondidas pela testemunha. Após, caberá à outra parte fazer suas perguntas. O juiz, como regra, questionará ao final, perguntando apenas sobre os pontos relevantes não esclarecidos. É, claramente, uma função completiva, e não mais de protagonismo.
O juiz preside o ato, controlando a atuação das partes para que a prova seja produzida nos limites legais e do caso penal. Ademais, poderá fazer perguntas, sim, para complementar os pontos não esclarecidos. Jamais se disse que o juiz não poderia perguntar para as testemunhas na audiência! O ponto nevrálgico é: poderá o juiz fazer perguntas para a testemunha, mas não como protagonista da inquirição.
Infelizmente, como diria Einstein, que época triste esta nossa, em que é mais fácil quebrar um átomo do que um preconceito...
A reforma veio, mas as práticas inquisitórias continuaram. Para agravar o cenário, os tribunais brasileiros também fizeram uma leitura bastante reducionista da situação e passaram a admitir a inversão na ordem das perguntas e o retorno do juiz-ator-inquisidor. Ou seja, rasgaram o artigo 212 do CPP. Disseram qualquer-coisa-sobre-qualquer-coisa, recordando as inumeráveis lições de Lenio Streck sobre o erro e o perigo desse tipo de decisionismo. O conceito coringa, para salvar um jogo perdido, foi invocar a famigerada tese de "nulidade relativa" e a falta de "prejuízo" (https://www.conjur.com.br/2014-set-05/limite-penal-sistema-nulidades-la-carte-superado-processo-penal). Mas há esperança.
No HC 111.815/SP[iii], julgado no dia 14/11/2017, a 1º Turma do STF (por maioria, houve divergência em relação à extensão do HC) decidiu que, "na audiência de instrução e julgamento, o juiz deve observar o disposto no artigo 212 do Código de Processo Penal (CPP), a fim de que, primeiramente, as partes interroguem as testemunhas, podendo o magistrado formular perguntas apenas quando algum esclarecimento for necessário".
A turma acolheu o HC para determinar a nova inquirição das testemunhas, observada a regra do artigo 212 (disse o óbvio, convenhamos...) do CPP.
Interessante a manifestação do ministro Marco Aurélio no sentido de anular todo o processo-crime, a partir da audiência de instrução e julgamento, porque "fica difícil para o Estado-juiz, iniciando o interrogatório, manter a equidistância. Segundo o ministro, a praxe da referida juíza é no sentido de dar início às perguntas a serem formuladas para as testemunhas e depois dar a palavra às partes, sem prejuízo de complementação de novas perguntas pelo juízo. 'Não posso fechar os olhos ao que assentado pela magistrada', ressaltou o relator ao destacar que a própria juíza disse claramente que adota a prática em todo e qualquer processo-crime. O ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator".
A decisão é muito recente e não está disponível o inteiro teor do acórdão, o que deve ocorrer nos próximos dias, mas as informações do julgamento contidas na notícia fornecida pelo STF já são alentadoras.
São quase 10 anos de vigência do artigo 212, cuja redação é claríssima e não dá margem para a interpretação (absurdamente restritiva) feita por muitos juízes e tribunais, que nada mais fazem do que negar o novo e perpetuar as velhas práticas inquisitórias, no mais puro e absurdo decisionismo. Não há espaço interpretativo na redação do artigo 212 que autorize o protagonismo inquisitório do juiz e tampouco a inversão da ordem das perguntas.
O parágrafo único então é ainda mais claro e inequívoco: "Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição".
Respeitando minimamente o tipo processual penal (Princípio da Legalidade), extraímos três regras básicas:
· o juiz pergunta depois das partes (exigência do caput, clara e taxativa: "As perguntas serão formuladas pelas partes");
·  o juiz pergunta depois das partes e apenas sobre os "pontos não esclarecidos';
·  a atuação do juiz é "complementar", não protagonista.
Acabou, ou pelo menos deveria ter acabado, desde 2008, o juiz-ator-protagonista-da-instrução, que começava perguntando para as testemunhas, esgotava a sua inquirição e inquisição, deixando o que "sobrasse" para as partes, que nada mais faziam do que um puro golpe de cena, pois o juiz já estava convencido e "satisfeito" (logo, ausente o "efeito atenção", bem explicado por Ruiz Ritter[1]).
Disso já sabemos todos, mas, em um país em que vale mais o argumento de autoridade do que a autoridade do argumento, ainda estava faltando, para muitos julgadores, a palavra do pai-tribunal. Pois aí está.
Agora, que se cumpra o artigo 212 do CPP, apenas isso!


[1] Na obra Imparcialidade no Processo Penal: reflexões a partir da teoria da dissonância cognitiva. Editora Empório do Direito, 2017.


[i] MORAIS DA ROSA, Alexandre. https://www.conjur.com.br/2017-jan-27/limite-penal-tao-conveniente-antidemocratico-decidir-depois-justificar
[ii] Sobre essas questões, remetemos o leitor para nossa obra Direito Processual Penal, 14ª edição, e também Fundamentos do Processo Penal, 3ª edição, ambas publicadas pela editora Saraiva.
[iii] http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=361859



PSICOLOGIA DO TESTEMUNHO: FALSAS MEMÓRIAS NO PROCESSO PENAL
Nos processos que tentam a (re)construção do fato criminoso pretérito, podem existir artimanhas do cérebro, informações armazenadas como verdadeiras, ou induções dos entrevistadores, de outras pessoas e/ou da mídia que, no entanto, não condizem com a realidade. Estas são as chamadas falsas memórias, processo que pode ser agravado, quando da utilização de técnicas por repetição de perguntas, como as empregadas de forma notória no âmbito criminal.
Falsas memórias consistem em recordações de situações que, na verdade, nunca ocorreram ou aconteceram de forma diversa de como lembrado pela vítima/testemunho. A interpretação errada de um acontecimento também pode desencadear esse processo.
Embora não apresentem uma experiência direta, as falsas memórias representam a verdade como os indivíduos as lembram[1]. Podem surgir de duas formas: espontaneamente ou através de uma sugestão externa.
Além disso, a qualidade da prova pode estar comprometida também quando da decorrência de lapso temporal exacerbado entre a coleta dos depoimentos policiais e os testemunhos judiciais, favorecendo a produção de memórias falsificadas.
A influência do tempo já foi reconhecida judicialmente como prejudicial à qualidade da prova, como vemos:  “Parte da prova oral colhida em juízo, cinco anos depois, certamente foi prejudicada pela ação do tempo, que opera o esquecimento dos fatos e até a inclusão de falsas memórias”[2].
Enxergar, através dos olhos da testemunha, é um dos desafios comuns ao juiz durante o processo penal. Apesar desta dificuldade e de todas as possíveis “impurezas”, advindas deste tipo de prova, não é possível prescindir de sua existência[3]. Isto porque existem crimes, especialmente os materiais, que dificilmente poderão ser analisados de outra forma que não pela testemunha. O homicídio é um claro exemplo desta situação.
Mas, como o juiz poderia utilizar-se desta experiência da testemunha? A resposta é bastante complexa.
Ao presenciar o fato, certamente, a testemunha o interpreta, de acordo com sua própria vivência que, na maior parte das vezes, não é a mesma do juiz. Alexandre Morais da Rosa nos traz uma possibilidade interessante: “A melhor maneira de julgarmos um processo crime é imaginar o enredo sem o ato violento ou criminalizado”[4]. É necessário, portanto, um certo afastamento para consegui-lo[5].
Aqui deixamos bastante evidente que não se trata apenas de avaliarmos as atuações do órgão acusatório e da magistratura, mas, necessariamente, de todos eles que terão participação ativa na (re)construção do fato passado. Portanto, processos que gerem falsas memórias não dependerão apenas de quem tem a função de acusar e a quem julga, mas também, daqueles defensores que, em contraditório, lançarão mão das melhores estratégias para evitar distorções.
O sistema de oitiva de testemunhas, adotado na legislação brasileira, a partir da reforma processual de 2008, é semelhante ao cross examination (ou exame direto e cruzado[6]) norte-americano, já que, em ambos, a acusação e a defesa realizam os seus questionamentos diretamente às testemunhas. Neste formato, as partes ficam sujeitas ao contrainterrogatório de seu oponente. Existe, porém, importante diferença: o processo penal brasileiro não limitou a atuação do juiz, no sentido de somente presidir o ato, mas também permitiu a ele a faculdade de complementar a inquirição acerca dos pontos não esclarecidos[7].
O artigo 212 do CPP traz algumas limitações às perguntas realizadas. Estas não poderão induzir resposta, nem ter relação com a causa e importar em repetição, sendo o magistrado responsável por fiscalizar a inquirição[8]. Neste ponto, constatamos importante dificuldade de nosso regramento legal: inexistem definições do que seriam perguntas que induzem à resposta.
Estas são questões cruciais a serem enfrentadas em nossos próximos textos, incluindo a análise das estratégias atualmente utilizadas nas legislações comparadas.
Por enquanto, precisamos saber que falsas memórias existem, possuem repercussão crucial (inclusive judicial, como visto) e são de difícil identificação, pois quem relata crê verdadeiramente em sua versão.
Desta forma, será necessária profunda análise acerca dos métodos/técnicas recomendados na melhor literatura para tentar prevenir a formação de falsas memórias. Apenas desta forma, talvez poderemos efetivamente impedir erros judiciais traduzidos em insuportáveis privações de liberdade.
Gustavo Noronha de Ávila é Doutor e Mestre em Ciências Criminais pela PUCRS. Professor do Mestrado em Direito do Unicesumar, onde ministra a disciplina “Psicologia do Testemunho e Efetivação de Direitos Humanos”. Professor de Direito Penal e Criminologia das Faculdades de Direito da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e da Unicesumar. Também é docente nos cursos de especialização em Direito Penal e Processual Penal da Universidade Estadual de Maringá, Unicesumar, Instituto Paranaense de Ensino e do Centro Universitário Ritter dos Reis (Porto Alegre/RS). Autor da obra “Falsas Memórias e Sistema Penal: A Prova Testemunhal em Xeque” (2013), e co-autor, com Vera M. Guilherme, de “Abolicionismos Penais” (2015), ambas publicadas pela Editora Lumen Juris (RJ).

REFERÊNCIAS
[1] BARBOSA, Cláudia. Estudo experimental sobre emoção e falsas memórias. Porto Alegre: PUCRS, 2002. Dissertação (Mestrado em Psicologia), Faculdade de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2002, p. 26.
[2] RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação criminal 70020430146/RS. Julgamento em: 29/11/2008. Diário de Justiça do Rio Grande do Sul, em 08/11/2007. Acesso em: 15 nov. 2008. Disponível em: . Acesso em: 3 fev. 2014.
[3] CARNELUTTI, Francesco. Lições sobre o processo penal. Campinas: Bookseller, 2004, v. 1, p. 292.
[4] MORAIS DA ROSA, Alexandre. Quando se fala de juiz no novo CPP de que juiz se fala? In: COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. O novo processo penal à luz da Constituição (Análise crítica do Projeto de Lei nº. 156/2009, do Senado Federal). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 128.
[5] Ibidem, p. 128.
[6] GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Provas. In: MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis (Coord.). As reformas no processo penal: as novas Leis de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 284.
[7] DI GESU, Cristina Carla. Prova penal e falsas memórias. Dissertação (Mestrado em Ciências Criminais) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre: 2008, p. 102.
[8] GIACOMOLLI, Nereu José. Reformas (?) do processo penal – Considerações críticas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 57. 


quinta-feira, 2 de novembro de 2017

EXERCÍCIOS DE EXECUÇÃO TRABALHISTA

O que é a execução trabalhista?
A execução trabalhista é a fase do processo em que se impõe o cumprimento do que foi determinado pela Justiça, o que inclui a cobrança forçada feita a devedores para garantir o pagamento de direitos. A fase de execução só começa se houver condenação ou acordo não cumprido na fase de conhecimento, em que se discutiu ou não a existência de direitos.
 
 Quando e como se inicia a execução trabalhista?
A execução trabalhista tem início quando há condenação e o devedor não cumpre espontaneamente a decisão judicial ou quando há acordo não cumprido. A primeira parte da execução é a liquidação, em que é calculado, em moeda corrente, o valor do que foi objeto de condenação. A liquidação pode ocorrer a partir de quatro tipos de cálculos: cálculo apresentado pela parte, cálculo realizado por um contador judicial, cálculo feito por um perito (liquidação por arbitramento) e por artigos de liquidação (procedimento judicial que permite a produção de provas em questões relacionadas ao cálculo).
Os valores definidos na execução trabalhista podem ser contestados?
Sim. Antes de proferir a sentença de liquidação, o juiz do Trabalho pode optar por abrir vista às partes por um prazo sucessivo de dez dias para manifestação sobre o cálculo, em que devem ser indicados itens e valores objeto da discordância, sob pena de preclusão (perda da oportunidade de impugnar o cálculo depois), conforme o art. 879, § 2º., da Consolidação das Leis do Trabalho. Já o art. 884 da CLT possibilita a homologação direta dos cálculos pelo magistrado, com possibilidade de eventual impugnação posterior, quando efetuado o depósito do valor em conta judicial ou realizada a penhora do bem de valor igual ou superior ao da execução.
O que acontece após a definição do montante a ser pago?
Proferida a sentença de liquidação, o juiz expede mandado para que o oficial de Justiça intime a parte condenada a pagar a dívida mediante depósito de dinheiro em juízo ou oferecimento de bens a penhora no prazo de 48 horas. Os bens penhorados ficam sob a subordinação da Justiça para serem alienados (transferidos ou vendidos) e não podem desaparecer ou serem destruídos. Caso isso ocorra, o responsável designado pode responder criminalmente como depositário infiel.
Quais os recursos judiciais possíveis durante a execução trabalhista?
Efetuado o depósito ou a penhora, as partes têm cinco dias para impugnar o valor da dívida, desde que o juiz não tenha aberto prazo para contestação antes de proferir a sentença de liquidação ou que, aberto o prazo, na forma do $ 2o., do artigo 879, da C.L.T., a parte tenha impugnado satisfatoriamente. O exeqüente pode apresentar um recurso chamado “impugnação à sentença de liquidação”.  Já o recurso que pode ser interposto pelo executado é chamado de “embargos à execução”. Após decisão do juiz sobre quaisquer desses recursos, é possível ingressar com um novo recurso, chamado de ”agravo de petição”, no prazo de oito dias. Esse recurso é julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho correspondente. Recursos aos tribunais superiores no processo de execução trabalhista só são possíveis em casos de violação à Constituição Federal.
Em que momento ocorre a venda dos bens penhorados?
A alienação dos bens penhorados durante a execução trabalhista só ocorre após o trânsito em julgado do processo de execução, ou seja, após decisão final sobre o montante devido, sem que haja qualquer recurso pendente de julgamento ou quando se tenha esgotado o prazo para recorrer sem que qualquer das partes tenha se manifestado. A partir daí, o depósito judicial é liberado para o pagamento da dívida ou o bem penhorado é levado a leilão para ser convertido em dinheiro.
O que acontece se o devedor não tiver bens para o pagamento?
O processo vai para o arquivo provisório até que sejam localizados bens do devedor para pagamento da dívida trabalhista. 

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

DICAS DE DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO: LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA E EXECUÇÃO TRABALHISTA             Prof.Esp. Técio Leite

1 - Visando facilitar o procedimento executório, qualquer pessoa física ou jurídica tem direito de solicitar ao TST o cadastramento de conta única apta a acolher bloqueios on line realizados por meio do sistema Bacen Jud.

2 - As partes serão intimadas para a elaboração dos cálculos de liquidação. Vindos aos autos os cálculos, o juiz poderá abrir vista para a impugnação, pelo prazo de 10 dias sucessivos, sob pena de preclusão. (Art. 879, parágrafo 2º da CLT)

3 - São títulos executivos no processo do trabalho: as decisões passadas em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos, quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados perante o MPT e os termos de conciliação firmados perante a Comissão de Conciliação Prévia.

4 - No processo trabalhista, a liquidação de sentença poderá ser feita por cálculo, por arbitramento ou por artigos. Na liquidação não se poderá inovar ou modificar a sentença liquidanda, e os cálculos sempre devem incluir as contribuições previdenciárias incidentes.
5Não esqueça que no processo do trabalho o juiz processará a execução ex oficio. A previsão expressa no art. 878 da CLT não se restringe apenas ao andamento inicial do procedimento executório, mas a todos os atos necessários à integral satisfação do crédito reconhecido.

6 - Se os cálculos de liquidação forem complexos, o juiz poderá nomear perito para elaboração, arbitrando honorários ao profissional, os quais serão satisfeitos pela reclamada, ao final.
7 - Nos termos do art. 880 da CLT, o executado será citado para cumprir a decisão ou pagar o valor devido no prazo de 48 horas, ou indicar bens à penhora sob pena de serem penhorados bens tantos quantos bastem para garantir a execução.

8 - Uma vez homologado o cálculo de liquidação, o remédio processual para a reclamada atacar a sentença de liquidação são os embargos à execuçãoJá para o reclamante o procedimento denomina-se impugnação à sentença de liquidaçãoAmbos os procedimentos devem ser opostos no prazo de 5 diascontados da garantia da execução.

9 - Nos embargos à execução, a matéria de defesa será restrita às alegações de cumprimento da decisão ou acordo, quitação ou prescrição da dívida. Havendo testemunhas arroladas, poderá o juiz marcar a audiência para a produção das provas.
10 - Somente nos embargos à penhora poderá o executado impugnar a sentença de liquidação, cabendo ao exequente igual direito e no mesmo prazo. Havendo embargos à execução e impugnação à sentença, ambos serão julgados na mesma sentença.

11Da sentença que julgar embargos à execução e/ou impugnação à sentença de liquidação, caberá agravo de petição, eis o recurso cabível contra as decisões do juiz nas execuções.

12 - Em se tratando de execução com prestações sucessivas por tempo determinado, a execução pelo não pagamento de uma prestação compreenderá as que lhe sucederem. Tratando-se de prestações sucessivas por tempo indeterminado, a execução compreenderá inicialmente as prestações devidas até a data do ingresso na execução.
13 - Quando a execução for definitiva, não fere direito líquido e certo do impetrante, o ato judicial que determina penhora em dinheiro do executado. Porém se a execução for provisória, não poderá o juiz determinar o bloqueio de valores, desde que o executado tenha indicado outros bens à penhora, no momento processual oportuno.

14 - Elaborada a conta, o juiz poderá abrir vista às partes para a impugnação. Esta impugnação não poderá ser genérica, eis que o impugnante deverá apresentar peça fundamentada, com a indicação dos itens e valores da discordância. Eventual impugnação sem fundamentação não será reconhecida.

15Caso o juiz não abra vistas do cálculo, homologará de pleno a conta, entretanto sem prejuízo das partes, uma vez que a parte por acaso contrariada pelo cálculo homologado poderá atacá-lo por meio de procedimento específico, no momento processual adequado.

"Nós todos temos o direito de levar uma vida feliz." - Dalai Lama


sexta-feira, 13 de outubro de 2017

1ª TAREFA DE PRÁTICAS AVALIATIVAS I
1ª) Explique  objetivo; definição e duração da Lei 9.456/97(Cultivares):
R: Em 1961 foi criada a União Internacional para a Proteção das Obtenções Vegetais (UPOV), Organismo Internacional destinado a assegurar a proteção de novas variedades de plantas. Porém, o Brasil só veio a fazer parte da UPOV a partir de 1999, aderindo ao tratado de 1978 dessa Organização. No entanto, esse tratado só passou a vigorar no país a partir de 28 de abril de 1997, com a Lei 9.456/97 (Lei de Cultivares), atendendo ao disposto no Art. 27, item 3b) do Acordo TRIPs, o qual estabelece que os Países-Membros terão que proteger as variedades de plantas por patentes, por leis sui generis, ou pela combinação das duas modalidades.
A Lei de Cultivares institui no Brasil o direito de Proteção de Cultivares. Esta proteção se dá mediante a concessão de Certificado de Proteção de Cultivar, considerado bem móvel e única forma de proteção de cultivares e de direito que poderá dificultar a livre utilização de plantas ou de suas partes de reprodução ou de multiplicação vegetativa.
Dois tipos de cultivares são considerados passíveis de proteção no Brasil: a nova cultivar ou a cultivar essencialmente derivada, de qualquer gênero ou espécie vegetal, ambas definidas pela Lei de Cultivares como:
A.    nova cultivar: a cultivar que não tenha sido oferecida à venda no Brasil há mais de doze meses em relação à data do pedido de proteção e que, observado o prazo de comercialização no Brasil, não tenha sido oferecida à venda em outros países, com o consentimento do obtentor, há mais de seis anos para espécies de árvores e videiras e há mais de quatro anos para as demais espécies; […]
B.     cultivar essencialmente derivada: a essencialmente derivada de outra cultivar se, cumulativamente, for:
§  predominantemente derivada da cultivar inicial ou de outra cultivar essencialmente derivada, sem perder a expressão das características essenciais que resultem do genótipo ou da combinação de genótipos da cultivar da qual derivou, exceto no que diz respeito às diferenças resultantes da derivação;
§  claramente distinta da cultivar da qual derivou, por margem mínima de descritores, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão competente;
§  não tenha sido oferecida à venda no Brasil há mais de doze meses em relação à data do pedido de proteção e que, observado o prazo de comercialização no Brasil, não tenha sido oferecida à venda em outros países, com o consentimento do obtentor, há mais de seis anos para espécies de árvores e videiras e há mais de quatro anos para as demais espécies.
O órgão responsável pela proteção desse tipo de PI é o Serviço Nacional de Proteção de Cultivares, ligado ao Ministério da Agricultura e do Abastecimento, mantendo um Cadastro Nacional de Cultivares Protegida. O objetivo desse Cadastro Nacional é promover a inscrição prévia das cultivares (protegidas ou não), habilitando-as para a produção e comercialização de sementes e mudas no país. São cinco os requisitos para a concessão de novas variedades de plantas: a distintividade, homogeneidade e estabilidade, a novidade, a utilidade e uma denominação própria.
Já o tempo de proteção de cultivar será de 15 anos, com exceção das videiras, árvores frutíferas, árvores florestais e árvores ornamentais, inclusive, em cada caso, o seu porta-enxerto, para as quais a duração será de 18 anos e ambos os prazos vigorarão a partir da data da concessão do Certificado Provisório de Proteção, pelo prazo de quinze anos.

2ª) Fale do impacto da sociedade em rede para o Direito.
R: Diante das constantes verificações de influências recíprocas entre o direito e a comunicação, surge a questão de mensurar quão importante tem sido o papel das novas mídias informacionais nas relações jurídicas estabelecidas na sociedade atual. O direito tem se tornado, cada vez mais, espaço de deliberação democrática, ao menos no que tange ao aspecto informacional, e isso vem ocorrendo a partir da facilitação do acesso à informação judicial, que outrora ficava restrita aos iniciados nos meios jurídicos. Por outro lado, a mídia vem tornando-se cada vez mais fator de impacto nas decisões judiciais, diante da repercussão que pode ser gerada a partir da ampla divulgação de processos judiciais e de seus trâmites.
Nesse contexto, a proposta do presente trabalho é analisar o uso de novas tecnologias de informação e seus impactos nas relações sociais e jurídicas. Para entender melhor como se dá este envolvimento, buscou-se na doutrina estudos que apontam como a força midiática influencia o andamento dos processos judiciais e o dia-a-dia dos cidadãos que dela são consumidores.
Esta busca justifica-se pelo fato de a temática estar relacionada diretamente aos processos constantes de mutação social, dos quais as relações comunicacionais são parte indissociável. Trazer o problema ao campo acadêmico, por si só, já é fator de relevo do trabalho, no entanto, alguns apontamentos serão realizados no sentido de demonstrar os pontos positivos e negativos ocorridos na delicada relação entabulada entre o direito e a comunicação, a fim de evidenciar quão intrincada encontra-se tal relação no contexto atual.
Eis um novo tempo, um tempo caracterizado por uma realidade social cada vez mais dinâmica, tecnológica e globalizada. Tudo mais rápido, prático e ao alcance de uma tecla.
A relação cada vez mais inevitável da tecnologia com os demais campos do conhecimento, como o direito, pode apresentar altos e baixos como foi visto neste trabalho. Se por um lado pode render iniciativas positivas, como no processo virtual, por outro pode ocasionar problemas como o crescimento descontrolado de crimes virtuais e o tratamento inadequado das informações.
Neste contexto, “deixa-se ao alvedrio do julgador a sua interpretação, que se vale de conhecimentos técnicos próprios e do direito comparado para decidir” sobre temas ainda não regulamentados, necessitando de estudo profundo das técnicas jurídicas, porém mais ainda do contexto social e tecnológico que lhe cerca, a fim de adaptar o direito à nova realidade informacional.
3ª) O que é uma ICP e quais os benefícios para o Direito?
R: A Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira, ou ICP-Brasil, é o sistema nacional de certificação digital, instituído pela Medida Provisória 2.200-2/01, com vigência diferida pela EC 32/02, constituindo-se em infraestrutura administrativa integrada por uma Autoridade Gestora de Políticas (Comitê Gestor da ICP-Brasil), uma Autoridade Certificadora Raiz (Instituto Nacional de Tecnologia da Informação — ITI), as Autoridades Certificadoras (emissoras dos certificados) e as Autoridades de Registro (identificam presencialmente o usuário, vedada qualquer espécie de procuração na aquisição do certificado, fato esse que o aproxima da aquisição da identidade tradicional). Todo esse aparato técnico existe apenas para garantir a autenticidade, integridade e validade jurídica do documento emitido em forma originariamente eletrônica (MP 2.200-2/01, art. 1º).
Atente-se, ainda, que tal Medida Provisória é uma norma nacional e não apenas federal, com aplicabilidade perante toda a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil, compreendida nessa a União, os estados, os municípios e o Distrito Federal (CF/88, art. 18, caput), diferentemente se se tratasse de norma federal, cujo âmbito material de aplicabilidade encontrar-se-ia restrito à União. Significa falar da unicidade territorial de tal modelo, não facultado a qualquer ente político (estados ou municípios, por exemplo) criar infraestruturas de certificação próprias, ainda que sigam, por simetria, o modelo imposto na Medida Provisória.
O destinatário de um documento eletrônico pode aceitar como válido qualquer certificado digital, ainda que não emitido pela ICP-Brasil. Porém, é justamente pela insegurança propiciada por esses outros certificados — que não possuem qualquer infraestrutura pública como o certificado ICP possui — que se condicionou a sua validade (rectius: eficácia) à aceitação dos partícipes. Cuidam, portanto, de interesse privados, e não públicos, como o certificado ICP-Brasil cuida. Significa, então, que se migra de um modelo de imposição legislativa (vez que o certificado digital ICP-Brasil tem a sua validade obrigatoriamente reconhecida) para um modelo potestativo, de acreditamento, frágil por definição. Apesar de nesse passo a legislação brasileira ter seguido a Diretiva Europeia 1.999/93, tal sistema de certificados digitais potestativos não é aconselhável. Ora, o interessado em utilizá-los fica a depender da aceitação do outro contratante e, uma vez dada, ainda pode ser impugnada judicialmente, sob a alegação, p. ex., de qualquer vício de consentimento (coação, erro). A justificativa para a existência do certificado, que é justamente dar segurança aos seus usuários, acaba por desaparecer, podendo ser transformada em um longo e desgastante processo judicial.
Conforme bem lembrado pelo Dr. Tejada, muitas vezes a tecnologia pode consistir em um verdadeiro empecilho aos advogados, como no caso de incompatibilidade entre os sistemas operacionais dos cartões e os diversos assinadores, ou entre esses e os diversos sistemas dos Tribunais. Ora, tais deficiências, que estão em muito minoradas — mas ainda existem, é certo — devem servir para um amadurecimento e homogeneização de todos os sistemas processuais eletrônicos, nunca para abandonar a sua principal tese, que é justamente a segurança inconteste fornecida pelo certificado digital ICP-Brasil e seus inúmeros benefícios: agilidade, redução de custos, diminuição do impacto ambiental.