segunda-feira, 26 de junho de 2017

CRIMES HEDIONDOS: DICAS RÁPIDAS QUE PODEM SALVAR UMA QUESTÃO EM SUA PROVA                                                                                        Prof. Leonardo Castro

Como adotamos o critério legal, são hediondos somente os crimes elencados no art.  da Lei 8.072/90. Por essa razão, não se fala, por exemplo, em hediondez na hipótese de homicídio do Presidente da República, pois o art. 29 da Lei 7.170/83 não integra o rol.

SÃO HEDIONDOS OS SEGUINTES DELITOS:
·         homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, incisos I, II, III, IV, V, VI e VII)
·         lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2o) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3o), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts.1422 e1444 daConstituição Federall, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;
·         latrocínio (art. 157, § 3º, in fine)
·         extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2º)
·         extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lº, 2º e 3º)
·         estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º)
·         estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º)
·         epidemia com resultado morte (art. 267, § 1º)
·         falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1º, § 1º-A e § 1º-B)
·         favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art. 218-B, caput, e §§ 1º e 2º)
·         genocídio (Lei 2.889/56).
Infelizmente, o rol dos crimes hediondos está entre aqueles assuntos que devem ser memorizados. Em prova, dificilmente será questionado se um crime X é o não hediondo. No entanto, é possível que a banca pergunte a respeito de prazos de prisão temporária ou de progressão de regime na hipótese de determinado delito, diferenciados em crimes hediondos.
Fique esperto: a tentativa não afasta a hediondez! Portanto, na hipótese de tentativa de estupro ou de homicídio qualificado, por exemplo, o crime permanecerá hediondo, devendo ser aplicada a Lei 8.072/90.
As “pegadinhas” em relação ao homicídio na Lei de Crimes Hediondos são sempre as mesmas. Questionarão se é possível a existência de um grupo de extermínio composto por uma única pessoa – a redação do art. 1º, inciso I, pode fazer com que o leitor chegue a tal conclusão. A resposta é não. O que o dispositivo quis dizer: não é preciso que todos os integrantes do grupo de extermínio participem da execução do homicídio para o reconhecimento de sua existência ou de sua hediondez.
Há divergência quanto ao número mínimo de integrantes de um grupo de extermínio. A Lei 8.072/90 não diz, mas boa parte da doutrina entende que a formação é a mesma da associação criminosa (CP, art. 288): três ou mais pessoas.

Não confunda grupo de extermínio com concurso de pessoas. Se Caio, Tício e Mévio decidem matar João, a hipótese será de homicídio em concurso de pessoas, e não de grupo de extermínio. Por outro lado, se o trio decide matar torcedores de determinado time, estará caracterizado o grupo de extermínio. Explico: a principal característica do homicídio em atividade típica de grupo de extermínio é a impessoalidade. A vítima é assassinada em razão de alguma característica especial (ex.: ser mendigo), e não por ser A ou B. A sua identidade é irrelevante para o homicida.
Em Direito, há exceção para tudo. No entanto, em relação às qualificadoras do homicídio, fique esperto: todas elas tornam o crime hediondo.
No § 1º do art. 121 do CP está previsto o intitulado homicídio privilegiado – na verdade, não é privilégio, mas causa de diminuição de pena -, hipótese em que o agente mata “impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima”. Não é crime hediondo, pois não está no rol do art.  da Lei 8.072/90.

Todavia, há uma situação que pode causar confusão: a do homicídio qualificado-privilegiado. Explico: O § 2º do art. 121 do CP possui qualificadoras de natureza objetiva (incisos III e IV) e subjetiva (I, II, V e VI). O homicídio privilegiado é compatível com as qualificadoras de natureza objetiva (ex.: o pai que mata o estuprador da filha com o emprego de veneno). Neste caso, o homicídio será considerado, ao mesmo tempo, qualificado e privilegiado. Surge, então, a dúvida: ele será hediondo? A resposta é não. A razão: em primeiro lugar, não há previsão no art.  da Lei 8.072/90. Ademais, não seria coerente, em um mesmo contexto, diminuir a pena e impor os malefícios da Lei dos Crimes Hediondos.
Agora, imagine a seguinte situação: Tício, agindo com vontade de matar por motivo torpe – logo, qualificado -, dispara tiros contra Mévio. No entanto, por erro na execução, atinge Caio, que vem a falecer. Pergunto: o fato de Tício atingir pessoa diversa da pretendida afasta a hediondez do crime? E se Tício confundisse as vítimas, e, ao invés de atirar em seu inimigo, matasse o seu irmão gêmeo? Nas duas hipóteses, o homicídio será hediondo. Isso porque, tanto na hipótese de “aberratio ictus” (CP, art. 73) quanto na de “erro sobre a pessoa” (CP, art. 20§ 3º), leva-se em consideração a vítima pretendida, e não a efetivamente atingida. Logo, se o homicídio foi praticado por motivo torpe (ou presente outra qualificadora), ele será hediondo, ainda que o agente não mate a vítima desejada, mas pessoa diversa.

Em 2009, o CP passou a contar com o § 3º em seu art. 158 (extorsão), com a seguinte redação: “Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente.”. Trata-se do intitulado “sequestro relâmpago”, que, por razões inexplicáveis, não foi incluído ao rol de crimes hediondos, ainda que ocorra a morte da vítima. Alguns autores entendem que o delito seria hediondo em razão da remissão que o dispositivo faz ao art. 159, §§ 2º e 3º, mas o raciocínio não deve prevalecer, pois, como já dito, o critério adotado para que um crime seja considerado hediondo é o legal. Ou seja, se um delito estiver no rol do art.  da Lei 8.072/90, é hediondo. Senão, não.

São equiparados aos crimes hediondos o tráfico de drogas, o terrorismo e a tortura. Significa dizer que a Lei 8.072/90 é aplicável a eles, exceto quanto ao que lei própria dispuser de outra forma. Por isso, as disposições da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas) e da Lei 9.455/97 (Lei de Tortura) devem prevalecer quando em conflito com a Lei de Crimes Hediondos (princípio da especialidade), que deve funcionar como norma geral.
Os crimes hediondos e equiparados são insuscetíveis de anistia, graça, indulto e fiança.

Perceba que o que a Lei 8.072/90 veda, em seu art. II, é a fiança, e não a liberdade provisória. Portanto, é possível que o acusado por um crime hediondo aguarde o desfecho da ação penal solto. O que não é possível, no entanto, é que a liberdade seja condicionada ao pagamento de fiança, por expressa vedação legal, mas o juiz não está impedido de impor outra das medidas cautelares do art. 319 do CPP.

No art. § 1º, a Lei 8.072/90 afirma que o condenado por crime hediondo iniciará o cumprimento da pena necessariamente em regime fechado, pouco importando o “quantum” de pena fixado. Todavia, o STF, ao julgar o HC 111.840/ES, declarou, em controle difuso, a inconstitucionalidade do dispositivo, e entendeu que o condenado por crime hediondo pode iniciar o cumprimento da pena em regime diverso (aberto ou semiaberto). Significa dizer que o dispositivo permanece em pleno vigor, mas tem sido afastado pelos Tribunais Superiores. O STJ tem seguido o entendimento, como é possível constatar no HC 306.352/SP, publicado no dia 24 de fevereiro de 2015.
A progressão de regime em crimes hediondos se dá com 2/5 (dois quintos), se primário o condenado, ou 3/5 (três quintos), se reincidente. É importante que o leitor memorize as frações, pois são cobradas em provas.
Em relação à prisão temporária, os prazos na Lei 8.072/90 são diferenciados. Em regra, a prisão temporária pode ser decretada por 5 (cinco) dias, prorrogáveis por mais 5 (cinco) dias. Tratando-se, no entanto, de crime hediondo, o prazo é de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período, em caso de extrema e comprovada necessidade. No entanto, atenção: alguns crimes hediondos não estão no rol da Lei 7.960/89, que prevê, em seu art. III, quais delitos estão sujeitos à medida. Como o rol é taxativo, é possível afirmar que alguns crimes hediondos não são passíveis de prisão temporária do agente que os pratica (ex.: a hipótese do inciso I-A, a lesão corporal contra determinados agentes públicos, incluído pela Lei 13.142/15).
A Lei 8.072/90, em seu art. § 3º, transmite a ideia de que, proferida a sentença condenatória, ainda que não tenha ocorrido o trânsito em julgado, o acusado deverá, em regra, ser preso, ainda que recorra da decisão – “Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.”. Entretanto, o fato de estar sendo acusado por um crime de maior gravidade não retira do réu garantias constitucionais a todos garantidas, como a presunção de inocência ou de não culpabilidade. Portanto, se o acusado permaneceu solto até a sentença condenatória, só será possível a decretação da prisão preventiva se presentes os requisitos do art. 312 do CPP, senão, ele deverá permanecer solto, não podendo o juiz vincular o conhecimento do recurso ao recolhimento à prisão.

Professor de Direito Penal. Acesse: www.professorcastro.com.


PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AO PROCESSO DE EXECUÇÃO   

Princípios são diretrizes aplicáveis a todos os ramos processuais, bem como no tocante à fase de execução. Assim, todos os princípios aplicam-se de forma efetiva e direita nos procedimentos executórios.  
Entre todos os princípios existentes no ordenamento jurídico, alguns se destacam no procedimento executório, tais como: Princípio da máxima utilidade da execução; Princípio do menor sacrifício do executado; Princípio do respeito à dignidade humana; Princípio da disponibilidade da execução; Princípio da realidade; Princípio da satisfatividade; Princípio da economia da execução; Princípio da especificidade da execução; Princípio da livre iniciativa; Princípio do contraditório. 

A aplicação do Princípio da máxima utilidade da execução visa a obtenção ao credor, de um resultado mais próximo que se teria caso não houvesse seu direito ferido. Sendo que, esta busca e a obtenção concreta dos resultados materiais, inicia-se no processo de conhecimento e finda-se com a aplicação e cumprimento da sentença.

Princípio do menor sacrifício do executado, busca equilibrar o processo executivo, objetivando a forma menos oneroso ao executado para a satisfação da execução. Humberto Theodoro Júnior entende que: “... deve realizar-se da forma que, satisfazendo o direito do credor, seja o menos prejudicial possível ao devedor. Assim, “quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor”. Na busca pela satisfação da execução, o operador do direito, neste caso o juiz, deverá buscar em suas decisões, meios que não prejudique de forma excessiva o devedor, mas que também não deixe de satisfazer, de forma material, o direito ferido do credor.

 Com relação ao Princípio do respeito à dignidade humana, nota-se que o mesmo se assemelha ao princípio do menor sacrifício do executado. Este princípio prisma a proteção do executado em relação a execução, ao não deixar que o mesmo seja exposto a situações incompatíveis com sua dignidade.

Já o Princípio da disponibilidade da execução reconhece ao credor a livre disponibilidade do processo de execução, desobrigando a execução do título, seja ele judicial ou extrajudicial. Neste caso, a execução civil pode ser prestada de duas formas, a primeira mediante processo autônomo e a segunda por atos executivos de cumprimento da norma jurídica subsequente ao processo de conhecimento, e em ambas o credor tem a livre disponibilidade de exercê-la. Desta forma, este princípio visa a possibilidade do credor de exercer seu direito de executar, seja ela na forma autônoma ou cumprimento de sentença.  
                                             
Princípio da realidade busca frisar que o processo executório deve somente recair sobre os bens patrimoniais do devedor, salvo nos casos de alimentos e depositário infiel. Na inobservância de patrimônio presente do devedor, este poderá recair nos futuros bens que o mesmo por ventura vir a adquirir.
Outro importante Princípio é o da satisfatividade, pois este assegura que o processo executório tende apenas à satisfação do direito do credor. Nota-se que, tal princípio está diretamente relacionado ao princípio da dignidade da execução e da realidade, pois ele delimita a incidência sobre o patrimônio do devedor e proporciona ao credor a possibilidade real de ver seu direito satisfeito.

Princípio da economia da execução no andamento processual da execução. Assim, o juiz antes de buscar a satisfação do credor, deverá analisar se o procedimento utilizado para este fim, não causará sérios prejuízos ao devedor.

De acordo com o Princípio da especificidade da execução o Estado deve fornecer uma tutela jurisdicional específica, proporcionado ao jurisdicionado um resultado semelhante ao que obteria caso não fosse necessário o processo. No caso das execuções, o resultado mais próximo ao esperado pelo credor se dará quando o devedor cumprir voluntariamente sua obrigação.

Entende-se que o Princípio da livre iniciativa possibilita, nos períodos prescricionais estipulados em Lei, que seja instaurado, por provocação do interessado, um processo executório. Este princípio se faz presente tanto no procedimento executório judicial como no extrajudicial. Mas cabe ressaltar que, mesmo se tratando de processo sincrético, processo de conhecimento e executório em ato contínuo, o credor deverá manifestar-se após a coisa julgada da sentença, requerendo o prosseguimento da ação, agora em sua fase executória.

E por fim o Princípio do contraditório, nada mais é que a possibilidade das partes serem ouvidas e que suas alegações sejam analisadas e ponderadas pelo magistrado.


quarta-feira, 21 de junho de 2017

DIREITO CIVIL RESUMO PARA PROVA    22.06.2017
1. POSSE - POSSUIDOR - DETENTOR
Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.
DETENTOR: Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Aquele que começou a comportar-se do modo especificado, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário.
MÚLTIPLOS POSSUIDORES: Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores.
2. CLASSIFICAÇÕES DA POSSE
É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.
É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.
O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.
A posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente.
Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida.
Base: artigos 1.196 a 1.203 do Código Civil.
3. AQUISIÇÃO: Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.
A posse pode ser adquirida:
I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante;
II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.
4. TRANSMISSÃO: A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.
Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.
IMÓVEL – VINCULAÇÃO: A posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a das coisas móveis que nele estiverem.
5. PERDA DA POSSE: Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o poder sobre o bem.
Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido.
Base: artigos 1.204 a 1.209, e 1.223 e 1.224 do Código Civil.
6.EFEITOS DA POSSE: O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.
6.1 RESISTÊNCIA À TOMADA DA POSSE: O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.
6.2 ALEGAÇÃO DE OUTREM: Quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de alguma das outras por modo vicioso.
6.3 AÇÃO DE ESBULHO: O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era.
6.4 NÃO APLICAÇÃO: O disposto nos itens antecedentes não se aplica às servidões não aparentes, salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio serviente, ou daqueles de quem este o houve.
6.5 FRUTOS: O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.
Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.
O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.
6.6 PERDA OU DETERIORAÇÃO: O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa.
O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante.
6.7 INDENIZAÇÃO: O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
As benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem.
O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo; ao possuidor de boa-fé indenizará pelo valor atual.
Base: artigos 1.210 a 1.222 do Código Civil.
 PROPRIEDADE
3.1. CONCEITO DE PROPRIEDADE
Compreendido os institutos da posse e da detenção, cabe tratar da propriedade, que, apesar de algumas semelhanças com os dois anteriores, aqui as distinções já se iniciam pelo fator de ser a propriedade um direito real preestabelecido em lei, já que a posse ou a detenção apenas geram faculdades semelhantes à propriedade, não conferindo plenos poderes sobre a coisa, ou seja, a propriedade não está limitada, salvo no concernente ao interesse público. Nesse entendimento de importância, pontifica José Carlos Moreira Alves:
"O que distingue o direito de propriedade dos outros direitos reais (os iure in re aliena) é a circunstância - como acentua Cario Longo5 - de ser ele o direito real de conteúdo mais amplo, e o único autônomo" (Direito Romano, Ed Revista Forense, 2000, p. 282).
Assim, antes de estabelecer uma concepção de propriedade, é interessante analisar a sua evolução histórica, apesar de haver muitas divergência sobre o assunto, a ponto de cada jurista apresentar teorias diversas de outros quanto da origem. Portanto, focando no que se conhece com segurança, sabe-se que a noção de propriedade no direito pré-clássico era chamada de propriedade quiritária, enquanto no direito clássico existiam mais três formas de propriedade, a monetária, provincial e peregrina, sendo conceituadas da seguinte forma:
1ª. Propriedade quiritária (exquiritium): É aquela peculiar somente aos cidadãos romanos, cabendo aos peregrinos apenas que tivessem o iuscommercii, se a coisa for bem móvel, pois se for imóvel, se limita apenas aos cidadãos romanos ou às províncias onde a jurisdição do direito romano alcançava;
2ª. Propriedade monetária: É a modalidade pertencente aos compradores de propriedade, que não adquiria o domínio do bem, apenas a posse, contudo, recebia uma proteção do pretor para que o proprietário anterior que ainda tinha o domínio, não reivindicasse do comprador, até que este último conquistasse o domínio através de usucapião;
3ª. A propriedade provincial: se tratava dos terrenos das províncias próximas a Itália, onde não havia sido estabelecido o iusitalicum, áreas que pertencia ao império, de modo que os particulares que obtivessem tais terrenos, apenas se limitavam na posse sob encargos pecuniários;
4ª. Propriedade peregrina: Os peregrinos que não fossem dotados do iuscommercii, não poderia adquirir a propriedade sobre bens móveis ou imóveis, de modo que, quando compravam um bem, se mantinham apenas na posse, contudo, uma posse protegida pelo pretor, a fim de que eles tivessem os mesmos poderes que um proprietário de proteção da coisa, de modo que ficou apelidada de propriedade de fato.
O que cabe, certamente, é que antes da noção de propriedade, de qualquer uma das quatro citadas, suscitou a posse, e os possuidores, que mantinham o bem sob sua custódia constante, são quem instituíram a propriedade, numa espécie de usucapião.
Por fim, Tais definições foram morrendo com o avanço da mentalidade humana, isto é, a deixa do coletivismo para o individualismo suscitado na era do renascimento e do mercantilismo, alcançando o conceito atual de hoje, a época do capitalismo social.
E sob esse exame, conceitua-se a propriedade no laço, de amarra forte, entre um sujeito de direito e um bem, corpóreo ou incorpóreo, cujo caráter da relação é de domínio, no sentido de contemplar o sujeito com amplos e plenos poderes, se exteriorizando e se comprovando a existência dessa modalidade de ligação entre pessoa e coisa mediante documentação.
E no intuito de colocar em prática esse conceito, basta analisar a situação de quando alguém põe a prova se um aparelho celular é realmente daquela pessoa, o que somente poderá esclarecer qualquer dúvida se apresentar nota fiscal, caixa que armazenou o aparelho e se possível comprovante de pagamento, isto é, documentos que comprovam e exterioriza a propriedade, já que um possuidor poderia também proceder como se fosse seu o celular, apesar de o não ser.
Nesse seguimento, estabelece a doutrinadora Maria Helena Diniz
"Poder-se-á definir, analiticamente, a propriedade, como sendo o direito que a pessoa natural ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha [...]" (Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas, Ed. Saraiva, 2010, p. 113).
Tal conceituação proveio da análise do artigo 1.228 do Código Civil, onde o legislador demonstra qual a vertente adotada no entendimento de propriedade. Contudo, para alcançar esta compreensão, os civilistas ponderam esse instituto sob três perspectivas, a saber:
1ª. Extrair de toda a gama de poderes concedidos pela propriedade, os elementos mais essenciais, isto é, as faculdades de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la;
2ª. Destacar a vontade do proprietário com relação ao bem, estando exteriorizada a propriedade pelo animus do dono.
3ª. Pela constatação da pertinência do bem ao proprietário, não importando qual seja a sua manifestação de vontade.
Percebe-se, portanto que foi adotado no Adjeto Civil Brasileiro a primeira perspectiva, tornando-se evidente quais são os elementos constitutivos da propriedade, que por sua vez são correspondentes ao jus utendi, fruendi e abutendi e à rei vindícatio dos romanos. Não se pode olvidar que tais elementos somados não é o que constituem a propriedade, posto que pode ocorrer de um proprietário de um imóvel não poder dispor desse, por tê-lo herdado num testamento com cláusula de inalienabilidade, o que não o torna menos proprietário, cabendo então verificar como segurança a veracidade da propriedade, por meio da existência de adequada aquisição da coisa, seja por tradição quando de bem móvel, ou pelo registro se bem imóvel cujo valor seja superior a 30 (Trinta) salários mínimos vigentes.
3.2. ESPÉCIES DE PROPRIEDADE

Assim, levando em conta os elementos que consolidam a essência da propriedade, esta se apresenta de quatro possíveis maneiras:
1ª. Propriedade plena, quando o proprietário pode exercer plenamente os direitos previstos no artigo 1.228 do CC;
2ª. Propriedade restrita ou limitada, quando o proprietário tem qualquer de seus poderes sobre a coisa cerceada, conforme o exemplo do herdeiro citado retro;
3ª. Propriedade definitiva, que é aquela não sujeita a qualquer tipo de gravame ou negócio que a torne resolúvel.
4ª. Propriedade resolúvel, que ocorre quando há algum gravame sobre o bem que limita a temporalidade da relação do proprietário com a coisa, extinguindo a propriedade quando do cumprimento de determinada condição ou termo, como no caso de fideicomisso, art. 1.951 do CC.
4. Resumo

Pelo estudo realizado de cada uma das modalidades dos dispositivos de direito real, das três modalidades do direito das coisas que mais se confundem, nota-se que há razões para a confusão, por conta de suas formas de exteriorização, principalmente aquelas em que o indivíduo demonstra abertamente um animus ou um cuidado de proprietário.
Além disso, percebe-se que há sempre uma coligação entre os institutos, bastando-se exercitar o raciocínio de que a detenção poderia se tornar posse se retirada as limitações de dependência e subordinação ou a motivação do ofício, o que constituiria o comodato, e por sua vez, a posse pode gerar a propriedade, como pela usucapião ou pela adjudicação compulsória movida por promitente comprador já possuidor, enquanto existe a possibilidade do retrocesso da propriedade para a posse, como no caso de uma empresa que constrói um prédio e com a finalidade de recuperar com rapidez o valor investido vende o imóvel, sob a condição de se manter como locatário. E nessa mesma linha, é concebível mediante esse exercício constatar também que a detenção pode se transmutar em propriedade, a posse e a propriedade em detenção, vicissitudes que se dão por fatos negociais ou não, porém sempre fatos jurídicos não visíveis aos olhos nu, isto é, necessário a análise da questão.
VIZINHANÇA
Conceito, características, soluções, árvores limítrofes, passagem forçada, águas e direito de construir.
CONCEITO
São regras que limitam o direito de propriedade a fim de evitar conflitos entre proprietários de prédios contíguos, respeitando, assim, o convívio social. Constituem obrigações propter rem (que acompanham a coisa).
Prevê o art. 1.277 do Código Civil que "o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha".
Os atos prejudiciais à propriedade podem ser ilegais, quando configurar ato ilícito; abusivos, aqueles que causam incômodo ao vizinho, mas estão nos limites da propriedade (barulho excessivo, por exemplo); lesivos, que causam dano ao vizinho, porém não decorre de uso anormal da propriedade (indústria cuja fuligem polui o ambiente, por exemplo).
Os atos ilegais e abusivos decorrem do uso anormal de propriedade, posto que ultrapassam os limites toleráveis da propriedade. Outro ponto a ser analisado para verificar a normalidade de uso é a zona de conflito, somados aos costumes locais, já que são diferentes num bairro residencial e industrial, por exemplo. Além disso, deve-se considerar a anterioridade da posse, pois a pessoa que comprou o imóvel próximo de estabelecimentos barulhentos não tem razão de reclamar.
Entende-se que os primeiros a se instalarem num certo local determinam a sua destinação, no entanto, esta teoria não é absoluta, ou seja, os proprietários não podem se valer da anterioridade para justificar a moléstia ao vizinho.
SOLUÇÕES
As reclamações serão atendidas apenas se danos forem intoleráveis. Sendo assim, deve o juiz primeiro determinar a sua redução, de modo a torná-lo suportável pelo homem normal.
De acordo com o art. 1.279 do CC "ainda que por decisão judicial devam ser toleradas as interferências, poderá o vizinho exigir a sua redução, ou eliminação, quando estas, se tornarem possíveis".
Porém, se não for possível que o dano seja reduzido a um nível normal de tolerância, determinará o juiz a cessação da atividade causadora do incômodo (fechamento da indústria, p.ex.). Deve-se observar, no entanto, que se a atividade for de interesse social, determina-se que o causador do dano pague indenização ao vizinho (art. 1.278 do CC).
A ação que deve ser interposta nestes casos é a cominatória, que pode ser ajuizada pelo proprietário, pelo possuidor ou pelo compromissário comprador. Porém, se o dano for consumado, caberá ação de ressarcimento de danos.
Estabelece ainda o art. 1.280 do CC que "o proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como que lhe preste caução pelo dano iminente".
ÁRVORES LIMÍTROFES
Dispõe o art. 1.282 do CC que "a árvore, cujo o tronco estiver na linha divisória, presume-se pertencer em comum aos donos dos prédios confinantes". 
Pode ainda, conforme previsto no art. 1.283, o proprietário do terreno invadido pelas raízes ou ramos de árvore que ultrapassarem a estrema do prédio, cortá-los até o plano divisório.
Tem direito, também, o vizinho aos frutos que caírem naturalmente no solo de seu imóvel, se este for particular. Já se cair em propriedade pública, o proprietário continuará sendo seu dono. 
Cabe lembrar que, sendo comum a árvore, os frutos e o tronco, pertencem a ambos os proprietários e, por isso, não pode um deles arrancá-lo sem o consentimento do outro.  
PASSAGEM FORÇADA: Argúi o art. 1.285 do CC que "o dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, ode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário".
Este direito só será válido se o encravamento for natural e absoluto, portanto, se houver uma saída mesmo que penosa, não pode o proprietário exigir do vizinho outra passagem.
Cabe ressaltar ainda que se houver alienação parcial do prédio e uma das partes ficar sem acesso à via pública, cabe a outra parte tolerar a passagem (art. 1.285, § 2º do CC).
Se não houver acordo, o juiz determinará a passagem pelo imóvel que mais facilmente prestá-la.
Não se confunde passagem forçada com servidão de passagem, já que esta constitui direito real sobre coisa alheia e provém geralmente de um contrato.  
DA PASSAGEM DE CABOS E TUBULAÇÕES
O proprietário deve tolerar a passagem de cabos e tubulações em proveito de seus vizinhos, mediante recebimento de indenização que atenda também a desvalorização da área remanescente, caso seja impossível que a passagem seja feita de outro modo, ou se muito oneroso (art. 1.286 do CC).
Pode o proprietário exigir que a instalação seja feita de modo menos gravoso, bem como depois seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel, como prevê o parágrafo único do art. 1.286 do CC. Assim como é facultado ao mesmo que exija a realização de obras de segurança quando as instalações oferecerem grave risco (art. 1.287 do mesmo diploma legal).  
DAS ÁGUAS: De acordo com o art. 1.288 do CC "o dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que correm naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu fluxo; porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo dono ou possuidor do prédio superior”. Prevê ainda o art. 1.290 do mesmo código o direito às sobras das águas nascentes e pluviais dos prédios inferiores, que poderão utilizá-las através de servidão.
Não pode o proprietário do prédio superior poluir as águas indispensáveis às necessidades primordiais dos possuidores dos imóveis inferiores e deverá recuperar ou ressarcir os danos pelas demais que poluírem, conforme dispõe o art. 1.291 do CC.Estabelece também o art. 1.292 do mesmo diploma que "o proprietário tem direito de construir barragens, açudes, ou outras obras para represamento de água em seu prédio; se as águas represadas invadirem prédio alheio, será o seu proprietário indenizado pelo dano sofrido, deduzido o valor do benefício obtido".  
LIMITES ENTRE PRÉDIOS E DIREITO DE TAPAGEM
Preceitua o art. 1.297 do CC: "o proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas.
É interesse do dono de um prédio que se estabeleça os limites extremos de sua propriedade".
A ação cabível para solucionar as confusões entre as linhas divisórias é a demarcatória, que não se confunde com ações possessórias e reivindicatórias.
Interposta tal ação o juiz delimitará as áreas de acordo com a posse justa e, no caso da mesma não ser provada, o terreno será dividido em partes iguais entre os prédios ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante indenização ao outro (art. 1.298 do CC).
Entende-se que os tapumes pertencem a ambos os proprietários confinantes que, por isso, devem arcar com as despesas de conservação e construção em partes iguais.
Porém, para "a construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno porte, ou para outro fim, pode ser exigida de quem provocou a necessidade deles, pelo proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas".  
DIREITO DE CONSTRUIR
1. LIMITAÇÕES E RESPONSABILIDADES
Argúi o art. 1.299 do CC que "o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos".
Assim, todo o proprietário deve ressarcir o seu vizinho pelos danos causados pela construção, podendo este último valer-se da ação de indenização, na qual provará a ocorrência do dano e o nexo de causalidade com a construção. 
Cabe lembrar que os construtores, arquitetos e empresas que prestam serviços de construção civil respondem solidariamente com os proprietários pelos danos causados pela obra, já que são técnicos habilitados para realizá-la. Se os danos decorrem de imperícia ou negligência do construtor, pode o proprietário que pagar sozinho valer-se de ação regressiva contra àquele.
2. DEVASSAMENTO DA PROPRIEDADE VIZINHA
Prescreve o art. 1.301 do CC "é defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro e meio do terreno vizinho", com a finalidade de resguardar a intimidade a intimidade das famílias. No entanto, não estão proibidas pequenas aberturas para luz e ventilação.
Pode o proprietário "no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho", conforme previsto no art. 1.302 do CC.
Entretanto, em se tratando de aberturas ou vãos para luz, poderá o vizinho levantar sua edificação ainda que vede a claridade do outro (art. 1.302, parágrafo único do CC).
Já na zona rural não de pode levantar edificações a menos de três metros do terreno vizinho (art. 1.303 do CC).
3. ÁGUAS E BEIRAIS: Estabelece o art. 1.300 do Código Civil que "o proprietário construirá de maneira que o seu prédio não despeje águas, diretamente, sobre o prédio vizinho", portanto, as águas pluviais devem ser despejadas no solo do proprietário e não no do vizinho, já que este só está obrigado a receber as águas que naturalmente correm para seu prédio.
4. PAREDES DIVISÓRIAS: Não se confunde com os muros divisórios, que são elementos de vedação regulamentados junto aos tapumes. As paredes divisórias integram a estrutura do edifício e constituem elemento de vedação e sustentação.
Cabe ao confinante que primeiro construir a possibilidade de "assentar a parede divisória até meia espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o direito a haver meio valor dela se o vizinho a travejar, caso em que o primeiro fixará a largura e a profundidade do alicerce" (art. 1.305 do CC).
5. USO DO PRÉDIO VIZINHO
Dispõe ao art. 1.313 do CC que "o proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para:
I - dele temporariamente usar, quando indispensável à reparação, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;
II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente".
A única restrição que pode o proprietário fazer é a estipulação de horários, por exemplo. Além disso, o vizinho que causar dano ao penetrar no imóvel tem o dever de repará-lo.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA 
Alienação Fiduciária em garantia consiste na transferência feita por um devedor ao credor de propriedade resolúvel e da posse indireta de um bem móvel infungível ou de um bem imóvel, como garantia de seu débito, resolvendo-se o direito do adquirente com o adimplente da obrigação, ou melhor, com o pagamento da dívida.
Alienação Fiduciária é um modelo de garantia de propriedades, móveis ou imóveis, que se baseia na transferência de bens como pagamento de uma dívida, a partir de um acordo firmado entre o credor e o devedor.

A alienação fiduciária, também conhecida por alienação em garantia, é uma prática bastante comum no Brasil, principalmente em negociações de automóveis e imóveis, onde o bem é adquirido pelo comprador a partir de um crédito pago em prestações.Neste caso, o veículo comprado, por exemplo, fica como garantia da dívida. O carro só passará a ser registrado no nome do comprador quando este quitar todo o pagamento do bem adquirido. Caso haja incumprimento nos pagamentos do crédito, o bem é tomado do devedor pelo credor.
Os bens sob o regime de alienação fiduciária não devem ser comercializados para terceiros pelo comprador / devedor (antes da quitação da dívida), sendo este apenas livre para usufruir da propriedade.
No Brasil, todos os aspectos referentes ao modo como a alienação fiduciária deve ser aplicada estão presentes na lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997.


ADJUDICAÇÃO
Adjudicação é um ato judicial que concede posse e propriedade de bens, móveis e imóveis, à alguém.

Em Direito Jurídico e Civil, adjudicação é o ato de transferir à pessoa que promove a execução judicial (o exequente) os bens penhorados ou os respectivos rendimentos arrecadados no processo, em pagamento do seu crédito contra o executado.
Adjudicação é o ato ou efeito de adjudicar, que significa dar ou entregar por sentença, ou seja, declarar judicialmente que um bem ou parte ideal dele, pertence a alguém. É assegurar judicialmente a alguém a propriedade de bens que deveriam ser ou foram levados à hasta pública, nos casos em que esta formalidade não pode ser dispensada.
No âmbito imobiliário, adjudicação é o processo no qual se estabelece que a propriedade de um bem imóvel se transfere de seu primitivo dono (o transmitente) para o adquirente (o credor), que a partir de então assume sobre ele todos os direitos de domínio e posse inerente a toda e qualquer concessão de bens (alienação).


USUFRUTO
Usufruto é aquilo que se usufrui, ou seja, que se pode desfrutar, que se pode fruir, que se colhe os frutos, que se tem o gozo e a posse temporária. Do latim “ususfructo”, que significa “uso dos frutos”.
Numa ordem decrescente do direito real limitado de fruição mais amplo (superfície) para o mais restrito (habitação), usufruto está em segundo lugar, pois é menos do que superfície e é mais do que uso.
Obs: observem que na ordem do 1225 eu pulei as servidões prediais, pois nas servidões não se destaca qualquer das faculdades do domínio; nas servidões não se destaca o uso, a fruição ou a disposição; bem, veremos servidões em breve.
Então propriedade é uso + fruição + disposição; superfície é uso + fruição e parte da disposição; já usufruto é uso + fruição; uso é apenas uso e habitação é um mini-uso.
PARTES DO USUFRUTO: usufrutuário e nu-proprietário. Assim, numa coisa dada em usufruto ousufrutuário vai adquirir as faculdades de usar e fruir da coisa, enquanto o proprietário permanece com a disposição; como o proprietário fica despido da posse direta, administração, uso e fruição da coisa, ele é chamado de nu-proprietário, afinal a posse e o uso de uma coisa são mais visíveis do que a disposição; a posse que o nu-proprietário conserva é a posse indireta (lembram do 1197? Lembram da Teoria de Ihering do 1196?
CONCEITOusufruto é o direito real limitado de gozo ou fruição conferido durante certo tempo a uma pessoa, que a autoriza a ocupar a coisa alheia e a retirar seus frutos e utilidades (1394). É dir. real de gozo ou fruição, não é dir. real de garantia, nem é contrato com efeito real. O usufruto é mais amplo do que o uso e a habitação, e mais restrito do que a superfície.
TEMPO: usufruto é duradouro, o mais comum é o usufruto vitalício, enquanto viver o usufrutuário, pois o usufruto não se transfere, não pode ser vendido ou doado, nem inter vivos e nem mortis causa; o que pode ser cedido é o exercício do usufruto, mas não o direito real em si (ex: A dá a B uma fazenda em usufruto, mas B não sabe administrar, então aluga/arrenda está fazenda a C – 1393, 1399; esta “cessão do exercício” do 1393 se dá através de direito pessoal (locação, comodato), mas não através de direito real; o direito real de usufruto em si não se transfere).
O usufruto pode ser hipotecado (dado em garantia a um credor) ? Não, pois quem não pode alienar não pode hipotecar (1420). A superfície pode ser hipotecada, pois já vimos que o superficiário pode alienar a superfície da coisa, o superficiário tem uma parcela do jus abutendi sobre a coisa, o usufrutuário não tem parcela da disposição, é só mesmo utendi e fruendi. 
Usufruto é direito misto, pois incide sobre imóveis (ex: uma fazenda) e sobre móveis (ex: uma vaca/rebanho, da qual o usufrutuário pode explorar o leite e as crias). 1390, 1397.  O usufruto sobre imóveis, já sabemos, exige registro (1391), salvo no caso do 1689, I, quando é automático: este usufruto do direito de família se justifica para compensar as despesas que os pais têm com o sustento dos filhos, mas é muito raro, afinal poucos menores têm bens (Sandy e Junior?).  O usufruto sobre móveis se perfaz pela tradição (= entrega da coisa).
FUNDAMENTO: a função moderna do usufruto é servir como meio de subsistência no âmbito familiar. Na prática hoje em dia nós só vamos encontrar usufrutos gratuitos e vitalícios no seio da família, com caráter alimentar ou para resolver problemas de partilha. É muito raro um usufruto oneroso, é melhor fazer uma superfície que tem mais vantagens. Ou se quiser uma coisa mais simples, é melhor e mais barato fazer uma locação ou comodato. Nosso CC é cheio de detalhes sobre usufruto que nós não vamos estudar por absoluta desnecessidade prática.
EXEMPLOS DE USUFRUTO NA ATUALIDADE: 1) com caráter alimentar: um pai tem um filho desempregado/complicado, então dá a ele em usufruto gratuito e vitalício uma casa para ele viver, e o filho poderá morar lá e alugar um quarto nos fundos a um terceiro, vender as frutas do quintal, etc.; 2) para resolver problema de partilha: um casal tem filhos e apenas um imóvel onde moram; o casal resolve se divorciar, com quem fica a casa? Sugestão: o marido sai de casa e o casal transfere a propriedade da casa para os filhos com usufruto gratuito e vitalício para a mãe; este é um acordo muito comum que se faz em divórcio; se os filhos crescerem e um dia quiserem vender a casa, vão vender com a mãe dentro porque usufruto é direito real, a mãe não pode ser obrigada a sair de jeito nenhum; chama-se isto de doação dos pais aos filhos em condomínio, com reserva de usufruto vitalício e gratuito para a mãe.   
EXTINÇÃO: o art 1410 traz os casos de extinção do usufruto, vamos comentá-los: I – extingue-se pela renúncia e morte, afinal o usufruto é intuitu personae e no máximo vitalício; é só a morte do usufrutuário que extingue o instituto, a morte do nu-proprietário não extingue, e seus herdeiros vão ter que respeitar o usufruto; II – alguma dúvida?; III – se a pessoa jurídica é usufrutuária, o prazo máximo são trinta anos; IV – ex: o filho atinge a maioridade e o pai perde o usufruto do 1689; V – se a coisa tinha seguro e foi destruída, o usufruto passa para a indenização, sub-roga-se na indenização, muda o objeto, de coisa para pecúnia, e o usufrutuário vai aplicar o dinheiro para ficar com os juros (= frutos civis = rendimentos, 1398), mas não com o principal (1407 e §§); VI – consolidação = confusão (ex: o pai dá a um filho o usufruto de um apartamento, então o pai morre e o filho herda o apartamento, consolidando nas suas mãos a propriedade plena, afinal direito real limitado na coisa própria é impossível); VII – o usufrutuário tem o dever de conservar a coisa, sob pena de resolução do usufruto; VIII – se o usufrutuário não usar a coisa, prescreve seu  poder sobre a coisa no prazo de dez anos do 205.    
HABITAÇÃO
HABITAÇÃO – é o mais restrito dos direitos reais de gozo ou fruição. É um mini uso, enquanto o uso seria um mini usufruto. Embora mais restrito do que o uso, a habitação não é letra totalmente morta, pois existe uma aplicação prática para o instituto no art. 1831. O imóvel deve existir na herança, não sendo obrigação dos herdeiros comprá-lo, salvo se determinado em testamento pelo falecido. A habitação é assim mais útil modernamente do que o uso, pois serve para proteger vitaliciamente alguém, provendo-o de uma casa.
CONCEITO: habitação é o direito real de uso gratuito de casa de morada, urbana ou rural. O titular vai residir com sua família em imóvel que não é seu.
Então habitação é apenas para morar, sempre é gratuita, é intransmissível, personalíssima e não se aplica a móveis (1414). Percebam que pela redação do 1414, a habitação é um mini uso e expressamente não pode ser cedida a terceiros, nem o exercício, muito menos o direito real em si.
SERVIDÃO
SERVIDÃO PREDIAL

Servidão vem de “servitus”, que significa escravidão, submissão. E prédio em direito não significa edifício, mas sim imóvel, edificado ou não. De modo que em linguagem jurídica uma fazenda, uma casa, um terreno, etc. são exemplos de prédios. Servidão predial seria assim a submissão de um imóvel, tratando-se de assunto importante neste semestre, juntamente com superfície.
A SP é um direito muito antigo, tão antigo quanto a propriedade, sendo conhecida dos romanos. Na SP não se destaca qualquer das faculdades do domínio (uso, fruição ou disposição), pois se trata de um limite ao domínio, semelhante aos nossos conhecidos direitos de vizinhança. Só que os DV são impostos pela lei para manter o bom convívio social (vide aulas do semestre passado) enquanto as SP são voluntárias, nascem da vontade das partes.
Na SP teremos um prédio com uma vantagem, um benefício, sobre outro prédio, que sofrerá uma restrição, um ônus, de modo que os donos destes prédios vão poder explorar esta vantagem ou ser obrigados a suportar a restrição.
O prédio com a vantagem chama-se prédio dominante e o prédio com a restrição chama-se prédio serviente, e seus donos é que vão se beneficiar ou prejudicar, afinal não existe relação jurídica sem sujeito. Existe sempre este binômio vantagem x restrição. Um imóvel vai servir a outro, beneficiando seus proprietários.
Exemplos de SP: ilimitados, “numerus apertus”, a depender da necessidade e da criatividade das pessoas; as principais seriam servidão de vista, de ventilação, de passagem (ou de trânsito), de passar aqueduto, de retirar água, de retirar areia, de retirar pedra, de pastagem, de passar esgoto, etc.
Então se A mora num apartamento perto da praia e quer garantir seu direito de vista ou ventilação sobre o mar, deve reunir o condomínio, procurar o proprietário do terreno da frente B e perguntar quanto ele quer para jamais construir ali um edifício. Pago o preço a B, A registra a servidão de vista no cartório de imóveis e curte a brisa para sempre (1378). Sem o registro em cartório a SP não vale contra terceiros, e equivale a uma obrigação de não-fazer (= direito pessoal, relativo, vinculado a duas pessoas, que não se exerce contra todos). É óbvio que o edifício de A vai ter que pagar por essa servidão, mas vão valorizar os apartamento. Já B vai receber uma quantia, mas vai restringir o uso do seu terreno da frente. Tratando-se de direito real, os futuros proprietários dos imóveis envolvidos vão para sempre se beneficiar ou se prejudicar, até que um novo acerto, um novo contrato, cancele a servidão, permitindo construções livres no terreno da frente (1387).  
CONCEITO: SP é o direito real limitado, imobiliário, impessoal, acessório, indivisível, permanente, impresumível, que impõe a um imóvel um ônus (= uma restrição) em proveito de outro prédio, contíguo (= vizinho) ou não, de donos diferentes.
Características e comentários ao conceito:
- É direito real limitado, pois o único direito real ilimitado é a propriedade.
- É imobiliário pois não incide sobre móveis, exigindo escritura pública e registro no Cartório de Imóveis.
- É impessoal pois se dá em favor do proprietário do prédio dominante, presente e futuro, prejudicando qualquer proprietário do prédio serviente.  É assim direito absoluto ( = erga omnes = que se exerce contra todos).
- É acessório pois é um direito vinculado ao de propriedade, não podendo ser separado, de modo que quem adquire o prédio dominante adquire a vantagem, e quem adquire o prédio serviente tem que suportar a restrição. A servidão não se vende separadamente = inseparabilidade.
- É indivisível pois não se perde e nem se adquire por partes. Indivisível é o direito à servidão, mas as vantagens do seu uso podem ser divididas (ex: servidão de retirar água dividida por vários condôminos moradores do prédio dominante) 1386.
- É permanente pois dura anos, décadas, séculos, até ser cancelada, transmitindo-se inter vivos ou mortis causa aos novos proprietários dos terrenos. 
- É impresumível pois não se presume, na dúvida não existe servidão, na dúvida o que existe é propriedade plena (1231). Então se seu vizinho está acostumado há anos a atravessar o seu terreno como um atalho isso não se transforma em servidão de passagem, pois é mera tolerância/cortesia de sua parte que não gera posse, tratando-se de simples detenção do vizinho (1208, 1ª parte). Veremos na próxima aula como pode ocorrer excepcionalmente servidão por usucapião.
- É proveitosa pois a servidão pressupõe vantagem/utilidade para o prédio dominante, então por exemplo deve ser extinta uma servidão de retirar pedra se a pedreira se acabar (1378, 1388, II). Esta característica inclusive é o fundamento da SP. O que justifica a SP? O fato de tornar mais útil, mais agradável, mais valiosa, mais vantajosa a condição do prédio dominante.
- os prédios devem ser próximos, devem ser vizinhos, mas não necessariamente contíguos/limítrofes.
- finalmente, os donos têm que ser diferentes, pois é direito real na coisa alheia, restringe a propriedade de outrém, não sendo possível servidão predial na coisa própria (1378, 1389, I).       
Formas de servidão: a depender da necessidade das partes e da característica dos prédios, a servidão pode consistir em 1) tolerar alguma coisa, é a servidão “in patiendo”, tem que ter paciência para suportar o vizinho passando, retirando areia, água, etc. 2) a outra forma é a servidão de abster-se de fazer alguma coisa, chamada “in non faciendo”, como por exemplo a servidão de não construir mais alto para manter a vista/ventilação do prédio dominante (1383). Observem que nunca cabe ao proprietário do prédio serviente fazer alguma coisa, sempre é suportar ou se abster em benefício do prédio dominante (1380 a 1382).
Constituição: a SP se forma, via de regra, por contrato mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Imóveis. Também se admite por doação ou testamento (ex: A doa um terreno a B com servidão de passagem para o vizinho C). Admite-se também excepcionalmente SP pela usucapião.
DIREITO DE SUPERFÍCIE
O direito de superfície, introduzido no novo Código Civil, irá substituir com vantagem o regime da enfiteuse. Diferentemente da enfiteuse, a superfície é instituto de origem exclusivamente romana. Decorreu da necessidade prática de se permitir a construção em solo alheio, principalmente sobre bens públicos. Os magistrados permitiam que comerciantes instalassem tabernas sobre as ruas, permanecendo o solo em poder do Estado. Entre particulares, o instituto estabelecia-se por contrato. É consagrado como direito real em coisa alheia na época clássica. Permitia-se a plena atribuição do direito de superfície a quem, sob certas condições, construísse em terreno alheio. Assim, passou-se a permitir que o construtor tivesse obra separada do solo. No entanto, sob o ponto de vista romano, o direito de superfície somente era atribuído a construções, não se aplicando às plantações em terreno alheio. O instituto não foi introduzido no Código Civil francês, pois era visto como forma de manutenção da propriedade feudal.
O Código Civil português atual, uma vez abolida a enfiteuse, conceitua a superfície como "faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou nele fazer ou manter plantações" (artigo 1.542). O objetivo é mais amplo do que na enfiteuse, permitindo melhor utilização da coisa. O proprietário do solo mantém a substância da coisa, pertencendo-lhe o solo, no qual pode ter interesse de exploração ou utilização do que dele for retirado. Tem esse proprietário, denominado fundeiro, a fruição do solo e do próprio terreno enquanto não iniciada a obra ou plantação pelo direito lusitano. O superficiário tem direito de construir ou plantar. O fundeiro tem também a expectativa de receber a coisa em retorno com a obra.
No nosso sistema somente se permite a modalidade temporária, não podendo ser direito perpétuo, como na legislação lusitana. O direito de superfície é instrumento técnico-jurídico propulsor do fomento da construção, tão necessário, sobretudo nos grandes centros populacionais, onde a carência habitacional é problema constante.
Alguns aspectos marcantes podem ser destacados nesse instituto, que é altamente complexo: a) há um direito de propriedade do solo, que necessariamente pertence ao fundeiro; b) há o direito de plantar ou edificar, o chamado direito de implante; e c) há o direito ao cânon, ou pagamento, se a concessão for onerosa. Após implantada, há que se destacar a propriedade da obra, edificação ou construção, que cabe ao superficiário; a expectativa de aquisição pelo fundeiro e o direito de preferência atribuído ao proprietário ou ao superficiário na hipótese de alienação dos respectivos direitos.
O Código Civil de 2002 aboliu a enfiteuse, introduzindo o direito de superfície gratuito ou oneroso (artigos 1.369 a 1.377), estabelecendo, no entanto, obrigatoriamente o prazo determinado. É vedada a modalidade perpétua. Não se confunde o prazo indeterminado com a perpetuidade, que entre nós é proibida. O pagamento devido ao proprietário, que pode ser periódico ou não, denomina-se "cânon superficiário".
Cuida-se também de direito real limitado sobre coisa alheia, que apresenta inegáveis vantagens sobre a enfiteuse, embora com muita analogia com esta. Permite a nova lei, de forma mais eficiente, que o proprietário atribua a alguém a conservação de seu imóvel, por determinado prazo, mais ou menos longo, sem que o proprietário tenha o encargo de explorá-lo pessoalmente ou mantenha ali constante vigilância contra a cupidez de terceiros. Nesse aspecto se aproxima muito da finalidade originária da enfiteuse.
Dispõe o artigo 1.369 do novo código: "O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis". Parágrafo único: "O direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao objeto da concessão".
Trata-se, portanto, de uma concessão que o proprietário faz a outrem, para que utilize sua propriedade, tanto para construir como para plantar. O Código Civil de 2002 se refere apenas ao direito de o superficiário construir ou plantar, não mencionando o direito correlato, mencionado pelo código português, qual seja, o de manter no local as plantações ou construções já existentes. Parece-nos que é inafastável também essa possibilidade em nosso direito, por ser da natureza do instituto, não havendo razão para a restrição. Desempenha importante função social não só quem constrói e planta, mas também quem mantém plantações ou construções já existentes no terreno de outrem.
Veja, por exemplo, a situação de um prédio inacabado que o superficiário se propõe a terminar. Trata-se do que a doutrina lusitana denomina direito de sobre elevação, que não contraria nossa legislação. Nesse sentido se coloca também o Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, que, paralelamente, disciplina também o direito de superfície de imóveis urbanos, trazendo problemas de interpretação.
Dá-se o nome de "implante" à obra ou plantação que decorre do direito de superfície, como já referimos. O contrato que lhe dá origem somente gera efeitos pessoais entre as partes. A eficácia de direito real somente é obtida com o registro imobiliário. Como regra geral, o superficiário não pode se utilizar do subsolo no nosso sistema do Código Civil, salvo se essa utilização for inerente ao próprio negócio, como, por exemplo, a exploração de argila para fabricar tijolos. É conveniente que os interessados sejam claros no pacto a esse respeito.
O Estatuto da Cidade, aqui citado, atravessou o Código Civil, pois são leis da mesma época, porque também disciplina o direito de superfície nos artigos 21 a 23. Tal obriga o intérprete a definir a aplicabilidade de ambos diplomas legais sobre a mesma matéria, pois há detalhes que não se identificam. Esse estatuto entrou em vigor noventa dias após a sua publicação, portanto antes do novo Código Civil. É de se perguntar se, no conflito de normas, o novo código, como lei de vigência posterior, derrogará os princípios do estatuto. Se levarmos em conta a opinião por nós defendida no sentido de que o Estatuto da Cidade institui um microssistema, tal como o Código de Defesa do Consumidor e a Lei do Inquilinato, e que, portanto, sob essa ótica, vigorará sobranceiro, em princípio, sobre as demais leis, ainda que posteriores. A matéria, no entanto, é polêmica e longe está da unanimidade. O desleixado legislador, para dizer o mínimo, poderia ter facilmente dado uma diretriz e não o fez.
www.tecioleite.blogspot.com