segunda-feira, 28 de agosto de 2017

PRINCÍPIO DA NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO
Significado e implicações
O princípio da não autoincriminação (nemo tenetur se detegerenemo tenetur ipsum accusareprivilegie against self-incrimination etc.), inerente à ampla defesa e à presunção de inocência, assegura ao suposto autor de crime (investigado, denunciado, testemunha) o direito de não produzir prova contra si mesmo[1].
Significa que o possível acusado de infração penal pode (livremente) colaborar ou não colaborar com a investigação, já que é sujeito de direito e não simples objeto da prova; mas, se não quiser cooperar, ninguém poderá obrigá-lo a tanto, razão pela qual, quando houver ilegal constrangimento, a confissão ou prova assim obtida será ilícita e arbitrária a eventual prisão.
Embora a Constituição (art. 5°, LXIII) se limite a dizer que o “preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado”, o direito ao silêncio constitui apenas uma das possíveis manifestações do princípio, não a única, talvez nem a mais importante, inclusive.
nemo tenetur tem caráter essencialmente negativo, pois consagra um direito de não fazer, de não colaborar, mas não um direito de fazer; é assegurada, por conseguinte, uma omissão, não uma ação. Justo por isso, não se presta a justificar condutas como destruição de provas (queima de documentos, remoção de sangue do local do crime etc.). Não fosse assim, seria possível (em tese) invocá-lo para legitimar os mais diversos crimes, a exemplo da morte da testemunha que presenciou o homicídio e a respectiva ocultação do cadáver.
Com relação à incidência no direito civil, a eventual recusa do réu em se submeter ao exame de código genético gera presunção legal de paternidade (Lei n° 12.004/2009), a qual não incide no processo penal, por força (inclusive) do princípio do estado de inocência.
Quanto às atuais implicações penais e processuais penais, há um certo consenso no sentido de que o princípio compreende: 1)o direito ao silêncio, preso ou solto o investigado (CF, art. 5°, LXIII; CPP, art. 186, parágrafo único[2]), podendo, inclusive, responder a certas perguntas e não responder a outras, silêncio que não pode ser interpretado em seu desfavor, nem implica confissão; 2)a necessidade de ser previamente informado dessa garantia; 3)privilégio de não prestar juramento ou compromisso de dizer a verdade; 4)o direito de se recusar a entregar documentos e de praticar qualquer comportamento ativo que o incrimine (fornecer material grafotécnico etc.); 5)a recusa de participar de reconhecimento, acareação ou reprodução simulada dos fatos; 6)o direito de ser dispensado do interrogatório (CPP, art. 457, §2°, final); 7)a vedação de perguntas capciosas ou em tom de ameaça que induzam o indivíduo à confissão ou delação; 8)o direito de não se submeter ao teste de alcoolemia (exame do bafômetro) nos delitos de trânsito; 9)a possibilidade de invocação do princípio perante qualquer juízo ou autoridade pública, cível ou criminal, policial ou parlamentar; 10)a não caracterização dos delitos de falso testemunho, desobediência ou desacato, quando no exercício estrito do privilégio; 11)a disponibilidade da garantia pelo colaborador na forma do art. 4°, §14, da Lei n° 12.850/2013[3]; 12)a ilegalidade de toda prisão fundada na recusa de colaborar com a investigação; 13)apesar do direito ao silêncio, o investigado ou acusado tem o dever de se identificar pelos meios legais, revelando nome e apelidos etc; 14)a legalidade das provas não invasivas, isto é, que não ofendam a integridade física do suspeito ou que não dependam de ação do indivíduo, com ou sem sua anuência, a exemplo de inspeções ou verificações corporais e coleta de material orgânico por ele descartado (v.g., sêmen contido em camisa de vênus, saliva em copos, cigarros etc.).
A doutrina diverge, porém, sobre diversos temas, tais como: 1) possibilidade de recusar-se a fornecer material biológico para obtenção de perfil genético nos termos da Lei n° 12.654/2012, para fins de identificação criminal; 2) implicações das declarações falsas ou mentirosas; 3) legitimidade da condução coercitiva do investigado ou acusado.
Questões controvertidas
Coleta de material genético
Todos somos passíveis de identificação civil na forma da Lei n° 12.037/2009, que dispõe sobre os meios ordinários de identificação (carteira de identidade, passaporte etc.). Já a identificação criminal, isto é, para fins de investigação criminal, é uma forma extraordinária de identificação e pressupõe a impossibilidade de identificação pelos meios comuns ou quando houver dúvida sobre a identidade do indivíduo.
Assim, sempre que for possível a identificação civil, é vedada a identificação criminal, como dispõe a Constituição, cujo art. 5°, LVIII, diz que “o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”. Nesse contexto, a coleta de material genético introduzida pela Lei n° 12.654/2012 é uma forma excepcional de identificação criminal. Não é, pois, ou não o é ainda, uma forma de identificação civil, embora possa vir a ser no futuro[4].
Além disso, a identificação criminal (datiloscópica, fotográfica, coleta de material biológico etc.) é admitida quando for imprescindível à investigação criminal e só é possível por meio de decisão judicial fundamentada (reserva de jurisdição). Mais: a coleta de material biológico ou de perfil genético só poderá ocorrer durante o inquérito policial ou processual penal, a requerimento da acusação ou da própria defesa.
Também os condenados por crime doloso praticado com violência ou grave ameaça à pessoa (homicídio doloso, estupro etc.) e hediondos (Lei n ° 8.072/90, art. 1°) serão necessariamente submetidos à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA. A identificação será armazenada em banco de dados sigiloso, e poderá ser acessada, mediante decisão judicial, pela autoridade policial para fins de investigação.
A questão que se impõe é: quando o investigado, réu ou condenado se opuser à coleta de material genético (coleta de sêmen, sangue, suor e lágrima etc.), é possível fazê-lo à força?
De um modo geral, a doutrina responde afirmativamente, invocando o princípio da proporcionalidade[5].
O STF já teve ocasião de julgar – em causa cível e antes do advento da Lei n° 12.654/2012 -, no sentido de que o acusado não está obrigado a se submeter a exame de DNA. Na ocasião o Ministro Marco Aurélio assinalou[6]:
Discrepa, a mais não poder, de garantias constitucionais implícitas e explícitas – preservação da dignidade humana, da intimidade, da intangibilidade do corpo humano, do império da lei e da inexecução específica e direta de obrigação de fazer – provimento judicial que, em ação civil de investigação de paternidade, implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao laboratório, “debaixo de vara”, para coleta do material indispensável à feitura do exame DNA. A recusa resolve-se no plano jurídico-instrumental, consideradas a dogmática, a doutrina e a jurisprudência, no que voltadas ao deslinde das questões ligadas à prova dos fatos.
Temos que a razão está com a doutrina minoritária. Como observa Renato Brasileiro de Lima, “em se tratando de prova invasiva ou que exija um comportamento ativo, não é possível a produção forçada da prova contra a vontade do agente. Porém, se essa mesma prova tiver sido produzida, voluntária ou involuntariamente pelo acusado, nada impede que tais elementos sejam apreendidos pela autoridade policial. Em outras palavras, quando se trata de material descartado pela pessoa investigada, é impertinente invocar o princípio nemo tenetur se detegere. Nesse caso, é plenamente possível apreender o material descartado, seja orgânico (produzido pelo próprio corpo, como saliva, suor, fios de cabelo), seja inorgânico (decorrentes do contato de objetos com o corpo, tais como copo, ou garrafas sujas de saliva etc.). Exemplificando, se não é possível retirar à força um fio de cabelo de um suspeito para realizar exame de DNA, nada impede que um fio de cabelo desse indivíduo seja apreendido em um salão de beleza”[7].
Com efeito, o princípio da proporcionalidade há de incidir, no processo penal, não para relativizar garantias, mas, ao contrário, para proteger o indivíduo contra eventuais excessos do poder punitivo. Logo, ainda que haja consentimento válido para tanto, a extração de material biológico há de ser admitida apenas para crimes especialmente graves e desde que não existam meios menos invasivos de produção da prova. Tampouco será tolerada quando puser em risco a vida, a saúde ou a integridade física do investigado.
Se quisermos tratar o acusado como sujeito de direito, e não como objeto da prova, a coleta de material biológico nunca poderá se realizar à força. O investigado, réu ou condenado, portanto, pode legitimamente recusar-se a se submeter a essa pequena tortura. Como escrevem Augusto Silva Dias e Vânia Costa Ramos[8]:
Em nosso entender, a dignidade da pessoa humana e suas explicitações representadas pelos direitos à integridade pessoal, à liberdade, à intimidade e à não-autoincriminação, fazem barreira à transformação da pessoa, dentro e fora do processo penal, em objecto ou banco de prova e à consecução de finalidades de eficiência processual (a “procura da verdade material” a que se refere o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto) por essa via. Quer essa coisificação se traduza na extracção coactiva de declarações, como acontece com a tortura, ou na recolha de ar expelido, de saliva, de sangue ou urina. Todos são segmentos da corporeidade que formata a condição humana e constitui o suporte biológico da unidade ética que cada pessoa é. O respeito pela dignidade intrínseca àquela condição e a esta unidade impõe que esses ‘pedaços de si’ não sejam obtidos à revelida da sua vontade. 
Possíveis implicações de uma falsa declaração 
Há quem defenda ser possível majorar a pena quando o réu mentir em juízo, pois, ao assim agir, violaria o dever de lealdade processual[9]. Temos, porém, que tal não é possível, visto que: 1)o dever de dizer a verdade só pode ser imposto a testemunha, perito etc., os quais responderão, em tese, por crime de falso testemunho (CP, art. 342); 2)o direito à ampla defesa permite a alegação de toda e qualquer tese, por mais inverossímil ou mesmo imoral; 3)mentir (na condição de réu) não é crime; tampouco a mentira pode justificar a aplicação de pena ou acréscimo de pena; 4) o só fato de mentir em juízo não diz absolutamente nada sobre a personalidade ou a conduta social do acusado; 5)a mentira não é em si mesma condenável, assim como a verdade não é em si mesma louvável, tudo dependendo do contexto e das motivações subjacentes[10]; 6)o interrogatório é essencialmente um meio de defesa.
Já Carrara assinalara que o réu tem o direito de se calar sem que isso implique qualquer prejuízo ou circunstância agravante por se negar a responder[11]. Mais recentemente Ferrajoli afirma que o princípionemo tenetur se detegere é a primeira máxima do garantismo processual acusatório e dela se seguem, como corolários, além do direito ao silêncio, a faculdade de o imputado faltar com a verdade em suas respostas[12].
Apesar disso, quando houver atribuição falsa de crime a outrem, o agente poderá responder, entre outros, por crime de calúnia, denunciação caluniosa ou autoacusação falsa (CP, arts. 138, 339 e 341). Aliás, de acordo com a Súmula 522 do STJ, a conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa.
É que, conforme vimos, o nemo tenetur tem implicações essencialmente negativas (direito ao silêncio, direito de não colaborar etc.), e não positivas, de praticar determinadas ações.
É certo, ainda, que o colaborador poderá responderá pelo crime do art. 19 da Lei n° 12.850/2013 (colaboração caluniosa)[13].
Condução coercitiva
De acordo com o art. 260 do CPP, se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.
Inicialmente, é de ver que, se não houver prévia intimação do réu e, pois, efetiva recusa de participar do ato, a condução será manifestamente ilegal.
Ademais, parece que, como o interrogatório no sistema atual, constitui, essencialmente, uma oportunidade de o réu exercer seu direito de defesa, não faz sentido algum constrangê-lo a tanto, isto é, obrigá-lo a comparecer ao ato. O que de fato importa, para exercício do contraditório e da ampla defesa, é que seja intimado na forma da lei e avalie se deve ou não comparecer ao interrogatório ou outro ato processual, se deve ou não fazer uso do direito ao silêncio etc. Consequentemente, qualquer ameaça ou constrangimento no sentido de fazê-lo comparecer ao ato contra a sua vontade será ilegal, abusivo.
Em suma, a condução coercitiva viola o nemo tenetur, como ensina Fernando da Costa Tourinho Filho[14]:
Se o acusado tem o direito de constitucional de permanecer calado, por óbvio não se justifica a condução coercitiva para que se proceda a interrogatório. Parece mesmo que o art. 260 tinha importância antes de a Constituição haver consagrado o direito ao silêncio, para que o Juiz pudesse valer-se das regras do art. 186, última parte, e 198, ambos do CPP. Tendo tais normas sido revogadas, parece claro que com elas também desapareceu, no particular, a razão da condução coercitiva. É verdade que o art. 260 cuida também da necessidade da presença do acusado para um reconhecimento, acareação ou qualquer ato sem que ele não possa ser realizado. Quanto ao reconhecimento ou acareação, sabe-se que o réu não está obrigado a fornecer prova contra si mesmo, e, desse modo, injustificável seria a condução coercitiva.


Notas e Referências:
[1] O princípio foi previsto na Constituição da Virginia (1776), cujo artigo 10 dizia que o investigado “Não pode ser forçado a produzir provas contra si próprio; e nenhum indivíduo pode ser privado de sua liberdade, a não ser pôr um julgamento dos seus pares, em virtude da lei do país”; e também na Quinta Emenda à Constituição americana (1791), que diz que a pessoa em nenhum caso criminal poderá ser compelida a ser testemunha contra si mesma. Atualmente está previsto em diversos tratados internacionais, a exemplo do Pacto de São José da Costa Rica (art. 8°, §2°, g) e do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 14.3, g).
[2] Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas. Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.
[3] O art. 4°, §14, da Lei, dispõe que: “Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.”
[4] Propondo a ampliação dos meios de identificação civil para todos os brasileiros, inclusive por meio da coleta de material biológico, Guilherme de Souza Nucci. Leis penais e processuais penais comentadas, v.2. São Paulo: RT, 2012.
[5] Nesse sentido, Augusto Silva Dias e Vânia Costa Ramos. O direito à não auto-inculpação (nemo tenetur se ipsum accusare) no processo penal e contra-ordenacional português. Coimbra: Coimbra editora, 2009. Assim também, Maria Elizabeth Queijo, “o nemo tenetur se detegere, como outros direitos fundamentais, não é absoluto, devendo coexistir no ordenamento jurídico com outros direitos e valores, como a paz social e a segurança pública, igualmente tutelados (limites implícitos e imanentes). Por isso, admitem-se restrições ao referido direito, em caráter excepcional, que deverão ser operadas sempre por lei, estrita e prévia, que atenda ao princípio da proporcionalidade, sob pena de inconstitucionalidade.” O direito de não produzir prova contra si mesmo. São Paulo: Saraiva, 2012, p.485.
[6] STF, tribunal pleno, HC 71.373/RS, Rel. Marco Aurélio, j.10/11/94, DJ 22/11/1996.
[7] Manual de direito processual penal. Salvador: juspodivm, 2016, p.80. No mesmo sentido, Thiago Ruiz (a prova genética no processo penal. São Paulo: Almedina, 2016, p. 128), para quem “…para aceitar como lícita a prova extraída corporalmente deve existir a conformação do acusado, e mais, para o consentimento ser válido, é necessária a presença de um advogado no momento da aquiescência do acusado em ceder ser material genético e que seja assegurado o direito à informação sobre os direitos do acusado, principalmente o direito à não autoincriminação. Posto que, no sistema acusatório contemporâneo, o acusado é  um sujeito de direitos e não um objeto da prova. Ademais, a determinação compulsória para a colheita de prova no corpo do acusado ofende os direitos fundamentais e garantias que lhe respaldam, como a intimidade, a integridade física, a dignidade da pessoa humana e o direito à proteção dos dados pessoais, o último, em razão da possibilidade de acesso ao segredo genético do indivíduo, isto se a técnica utilizada pelo perito recair sobre o DNA codificante”.
[8] O direito à não auto-inculpação (nemo tenetur se ipsum accusare) no processo penal e contra-ordenacional português. Coimbra: Coimbra editora, 2009, p.31.
[9] Nesse sentido, Vladimir Aras (A mentira do réu e o art. 59 do CP, in Garantismo penal integral. São Paulo: Gen/Atlas, 2015, p. 298/9): “O ordenamento jurídico brasileiro premia a verdade e repudia a mentira. Embora não seja crime mentir em sua própria defesa, a mentira do réu (diferentemente do seu silêncio) pode ser considerada em seu desfavor, retirando a credibilidade da tese defensiva, assim como pode redundar no reconhecimento de conduta social ou personalidade antiética, no exame dos requisitos subjetivos dos institutos regulados nos arts. 44, inciso III (substituição de pena), 59, inciso II (cálculo da pena-base), e 77, inciso II (sursis), do Código Penal, e no art. 89 da Lei n° 9.099/1995 (suspensão condicional do processo).  Mais adiante: “Não se quer tipificar a mentira do réu. Não se pretende que o acusado mendaz possa vir a ser condenado por falso testemunho. Isso é desnecessário e desproporcional. Mas quer-se fazer ver que o réu não tem o direito ou a faculdade de enganar, iludir ou fraudar o processo, seja por mentiras documentais ou por mentiras verbais. Tem o acusado o direito de silenciar e isso é suficiente para a sua defesa, pois conclusão adversa alguma pode ser extraída daí. Se mentir e ficar evidenciado, por ocasião da sentença, que o réu teve a intenção de malbaratar o desfecho do processo e tumultuá-lo com inverdades, para impedir a justa solução da causa (que pode ser a condenação), esse seu comportamento processual deverá ser levado em conta pelo juiz, segundo sua livre convicção motivada”.
[10] Como disse Nietzsche, “no fundo, todas as grandes paixões são boas se se lhes dá boa direção e carreira; a cólera, o prazer, o temor, o ódio, a esperança, o triunfo, a desesperação ou a crueldade. (…) Desde o momento em que se nega o Deus do ideal ascético, há que propor este problema do valor da verdade. A vontade da verdade necessita de uma crítica; é preciso pôr em dúvida o valor da verdade” (A Genealogia da Moral. São Paulo: Centauro, 2002, p. 97 e 106).
[11] Programa del curso de derecho criminal, v.2. Bogotá: Temos, 1973, p. 415, §932 .
[12] Derecho y Razón. Madrid: Trotta, p. 608.  
[13] O art. 19 da Lei dispõe: Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
[14] Código de processo penal comentado. São Paulo: Saraiva, 2009, p.718.
Paulo de Souza Queiroz é doutor em Direito (PUC/SP), Membro do MPF e Professor da UnB – Universidade de Brasília.


sexta-feira, 25 de agosto de 2017

DIREITO DE FAMÍLIA:CONSIDERAÇÕES GERAIS
CONCEITO DE DIREITO DE FAMÍLIA:
“O direito de família constitui o ramo do direito civil que disciplina as relações entre pessoas unidas pelo matrimônio, pela união estável ou pelo parentesco” Maria Helena Diniz.
HISTÓRICO:
1916 – O casamento era o que conferia o vínculo, reconhecido juridicamente, como familiar.
·         Não havia reconhecimento jurídico de família fora do casamento, só surgiu com a união estável. – introduzida pela CF/88.
Quem tinha o poder familiar era o pai (marido).
Características do pátrio poder:
Juiz – o pai determinava o que aconteceria com a mulher. Ex.: no caso de adultério, poderia castigar.
Proprietário – a mulher era propriedade do detentor do pátrio poder.
Chefe religioso – era quem ditava as regras da religião. A mulher deveria seguir a religião do marido.
Chefe político – a mulher, assim que teve direito ao voto, votava em quem o marido indicava.
FILHOS – dentro do casamento os filhos tinham direitos. Fora do casamento não gozavam de tal proteção. Existia a dicotomia: filhos legítimos e ilegítimos.
Legítimos eram aqueles havidos dentro da relação do casamento.
Ilegítimos eram os filhos que não procediam de justas núpcias, ou seja, advindos de relações extramatrimoniais.
A partir da Constituição Federal de 1988, a disciplina sobre o casamento e direito fundamentais e, consequentemente, irradiação dos direitos fundamentais imposta a toda legislação infraconstitucional, houveram mudanças drásticas nas entidades familiares. A promulgação do CC de 2002 ratificou respectivas – mudanças:
Espécies – famílias (entidades familiares) 226 CF.
A família assume uma acepção mais ampla, abrangendo: o casamento, união estável, família mono parental.
União homo afetiva – Antes do julgamento da ADPF 132, a interpretação do artigo 226 da CF era restritiva. Portanto, só era aceito a união entre homem e mulher, tanto para união estável quanto para o casamento. Contudo, o STF entendeu que se trata de um rol exemplificativo, visto que a vontade do legislador era fazer com que a família fosse ampliada e acompanhasse os avanços da sociedade.
Poder familiar:
Até 2002 era pátrio poder, mas a partir de 2002 teve uma nova roupagem. Homem e mulher exercem o poder familiar, a vontade de um nunca prevalece sobre a vontade do outro, ratificando o posicionamento externado pela CF/88.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§5º – Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
O Código Civil estabelece a igualdade entre o casal, da mesma forma:
Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.
Filhos:
Eram taxados de legítimos e ilegítimos, a partir da mudança não há mais essa divisão no direito de família.
Ex.: Filho fruto de uma infidelidade, não pode sofrer as consequências dessa relação extraconjugal. Deve ser tratado com equidade aos filhos oriundos do casamento ou união estável.
Art. 227. […]§ 6º – Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
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CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DO CASAMENTO
CONCEITO:
Portalis, um dos elaboradores do Código Civil francês, pretendendo ser objetivo, assim definiu o casamento: “É a sociedade do homem e da mulher, que se unem para perpetuar a espécie, para ajudar-se mediante socorros mútuos a carregar o peso da vida, e para compartilhar seu comum destino”.
Essa é uma das primeiras definições jurídicas do casamento. Contudo, várias críticas foram feitas a essa conceituação, especialmente por apresentar a vida como um fardo e não se referir ao caráter legal e civil do casamento, podendo servir também para certas uniões de fato.
Posteriormente, Clóvis Beviláqua, conceituou o casamento como “um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legalizando por ele suas relações se­xuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e a educar a prole, que de ambos nascer”
Contudo, esse conceito não merece prosperar tendo em vista que A falta de filhos não afeta o casamento, pois podem casar-se pessoas que, pela idade avançada ou por questões de saúde, não têm condições de procriar. E nunca se pensou em anular todos os casamentos de que não advenha prole.
Merecem referência as definições de Washington de Barros Monteiro e Pontes de Miranda. Para o primeiro, casamento é “a união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de se reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos”
Hodiernamente, não há de se considerar o casamento restrito a pessoas de sexos distintos, principalmente após o julgamento da ADPF 132, que reconheceu a união entre casal homo afetivo como objeto de proteção do Direito Brasileiro e, sua improrrogável extensão para o conceito de casamento.
Conceito moderno – Trata-se da união de pessoas com a necessidade de formar uma família, com o fim de se realizar, para encontrar no outro o que não se pode encontrar sozinho.
O vínculo afetivo é o predicado mais importante para a caracterização do casamento.
NATUREZA JURÍDICA:
A concepção clássica, também chamada individualista ou contratualista, acolhida pelo Código Napoleão e que floresceu no século XIX, considerava o casamento civil, indiscutivelmente, um contrato, cuja validade e eficácia decorreriam exclusivamente da vontade das partes.
– Institucionalista – pensava-se no casamento como uma instituição social, de grande relevância para a sociedade. Seus efeitos estavam todos na lei, não são instituídas pelas partes. Para essa corrente o casamento é uma “instituição social”, no sentido de que reflete uma situação jurídica cujos parâmetros se acham preestabelecidos pelo legislador.
– Ato jurídico: strictu sensu – os efeitos jurídicos produzidos decorrem da própria lei. É um ato humano que produz efeitos legais. Aqui não se trata de uma instituição.
– Contratualista – É um contrato especial (sui generes) do direito civil. Visto que não tem cunho patrimonialista. Em suma, o casamento é um contrato que se constitui pelo consentimento livre dos esposos, os quais, por efeito de sua vontade, estabelecem uma sociedade conjugal que, além de determinar o estado civil das pessoas, dá origem às relações de família, reguladas, nos pontos essenciais, por normas de ordem pública.
Obs: Não é o patrimônio, objetivo principal do casamento.
Efetivamente, como salienta Caio Mário, considerado como ato gerador de uma situação jurídica (casamento-fonte), é inegável a sua natureza contratual; mas, como complexo de normas que governam os cônjuges durante a união conjugal (casamento-estado), predomina o caráter institucional.
Carlos Roberto Gonçalves: “Não se pode deixar de enfatizar que a natureza de negócio jurídico de que se reveste o casamento reside especialmente na circunstância de se cuidar de ato de autonomia privada, presente na liberdade de casar-se, de escolha do cônjuge e, também, na de não se casar”.
Não decorre somente da lei (CC), mas da jurisprudência etc.
Portanto, em que pese grande divergência a respeito da natureza jurídica do casamento, é majoritária a posição do casamento como um contrato especial do direito civil.

DISSOLUÇÃO DO VÍNCULO E DA SOCIEDADE CONJUGAL

São as fórmulas de dissolução do vínculo e da sociedade conjugal:
Art. 1.571. A sociedade conjugal termina:
I – pela morte de um dos cônjuges;
II – pela nulidade ou anulação do casamento;
III – pela separação judicial;
IV – pelo divórcio.
·         1º O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente.
·         2º Dissolvido o casamento pelo divórcio direto ou por conversão, o cônjuge poderá manter o nome de casado; salvo, no segundo caso, dispondo em contrário a sentença de separação judicial.
Sociedade conjugal é o complexo de direitos e obrigações que formam a vida em comum dos cônjuges.
Quando dissolve o vínculo, permite que seja contraído novo casamento.
Morte – A morte a que se refere o art. 1.571, no inciso I e no § 1º, primeira parte, do Código Civil, como causa terminativa da sociedade conjugal e de dissolução do vínculo matrimonial, é a real. O cônjuge supérstite é autorizado a contrair novas núpcias, respeitado, quanto à mulher, o prazo do art. 1.523, II, do mesmo diploma, exigido para se evitar a turbatio sanguinis. Mors omnia solvit, já diziam os romanos, advertindo que a morte põe termo a todas as relações pessoais, que não possam prosseguir com os sucessores. Agora, o Código Civil de 2002, inovando, e pondo termo definitivamente à controvérsia, expressamente dispõe que o casamento válido se dissolve não só pelo divórcio e pela morte real, como também pela morte presumida do ausente, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva (CC, arts. 1.571, § 1º, segunda parte, e 6º, segunda parte)
Nulidade – A nulidade do casamento rompe o vínculo matrimonial, extinguindo a sociedade conjugal e permitindo que os cônjuges se casem novamente.
Anulação – Se, por exemplo, houve erro sobre a pessoa do outro cônjuge, revelado após o casamento e utilizado como motivação do pedido, a hipótese é de anulação do casamento e não de divórcio. Também a existência de anterior sentença de separação judicial ou de divórcio não constitui óbice para a propositura da ação anulatória.
3 anos para anulação a respeito do erro essencial. 1560 CC.
Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da data da celebração, é de:
III – três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557;
A anulação produz efeito da data da celebração do casamento até a data da sentença que anule o casamento.
Põe fim ao regime de bens do casamento.
Pela anulação, pode ser retirado o nome de família advindo do casamento.
Separação judicial – É a única dissolução que dissolve a sociedade conjugal, mas mantém intacto o vínculo conjugal. Não podendo, por exemplo, ser contraído novo casamento. Porque ainda se encontra vinculado com seu ex-cônjuge. Era conhecido com desquite. Foi retirada da constituição. Mas muitas pessoas ainda estão separadas judicialmente, por isso, deve se ter ciência do instituto.
As pessoas já separadas ao tempo da promulgação da emenda em epígrafe não podem ser consideradas divorciadas. Permanecem na condição de separadas, até que promovam o divórcio direto, por iniciativa de um ou de ambos, sem necessidade de observarem qualquer prazo, mantidas as condições acordadas ou judicialmente decididas.
Era um entreposto para chegar ao divórcio, ou seja, conditio sine qua non para se divorciar.
Divórcio – Antigamente era necessário fundamentar o divorcio, nos dias de hoje não precisa mais ser fundamentado.
SEPARAÇÃO:
De fato: Não é uma das causas de dissolução da sociedade conjugal. Ocorre no mundo fático, cada cônjuge vai para seu lado, sem buscar a regularização no mundo civil. Contudo, produz alguns efeitos. É possível que haja união estável com outra pessoa com 3º. Havendo separação de fato não é necessário o dever de fidelidade. Haverá resquício no direito de sucessões.
Na maioria das vezes não há vida em um comum no mesmo local, mas pode ocorrer.
Judicial:
Era possível até o ano de 2010, mas ainda existem pessoas que estão separados dessa forma, visto que era permitido pelo ordenamento jurídico.
“numa interpretação histórica, sociológica, finalística, teleológica do texto constitucional, diante da nova redação do art. 226, § 6º, da Carta Magna, sou levado a concluir que a separação judicial ou por escritura pública foi figura abolida em nosso direito, restando o divórcio que, ao mesmo tempo, rompe a sociedade conjugal e extingue o vínculo matrimonial. Alguns artigos do Código Civil que regulavam a matéria foram revogados pela superveniência da norma constitucional — que é de estatura máxima — e perderam a vigência por terem entrado em rota de colisão com o dispositivo constitucional superveniente”.
Efeitos:
– Fim:
Sociedade conjugal – não há mais necessidade, por exemplo, de citar a sociedade conjugal em uma ação possessória.
Regime de bens (partilha) – Finda o regime de bens, após a dissolução, pode ser adquirido qualquer bem de forma onerosa e tal bem será somente do cônjuge que comprou.
Obs.: A partilha de bens pode ser feita a qualquer tempo, antes, durante ou depois do casamento.
É melhor que a partilha seja feita antes, para que não haja problema.
Fidelidade – Põe fim no dever de fidelidade, pode ser assumido um novo relacionamento afetivo amoroso.
Vida em comum – Não é necessário que resida no mesmo lar conjugal do outro. Fixar o domicilio em qualquer lugar.
O abandono de lar não configura restrições de direitos como acontecia no passado.
– Nome – Gera a possibilidade de retirada do nome, ou reutilização do nome de solteiro.
Casos em que não pode ser retirado o nome:
1º caso – quando o nome já aderiu à personalidade da pessoa.
2º caso – o nome não pode distanciar o nome do cônjuge do nome dos filhos.
Na separação consensual, o cônjuge decide livremente a respeito do uso do sobrenome do outro. A omissão no acordo sobre essa questão não deve ser interpretada como renúncia, pois tem ele o direito de continuar a usar o nome do ex-consorte.
Assim, se na separação amigável a mulher optou por conservar o nome do ex-marido, pode a qualquer tempo voltar a usar o de solteira, requerendo ao juiz (que não precisa ser o que homologou a separação, podendo ser o de seu domicílio) que determine a averbação da alteração no Registro Civil.
– Filhos – Guardas, alimentos e visitas. – Os filhos não podem arcar com os ônus dos relacionamentos dos pais. Contudo, há efeitos para os filhos.
1566, IV.
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
Trata-se de norma possível de vigência, ainda que ocorra após a dissolução da sociedade conjugal.
Os deveres continuam o mesmo. 1583 e SS. CC. Compartilhada ou unilateral.
Obs.: Independente da espécie de guarda e do fim do motivo pelo qual findou o casamento, o poder familiar (aqueles exercido pelos pais na administração da vida e do patrimônio dos filhos) permanecerá intacto, sendo exercido por ambos. Ainda que haja separação, há discussão a respeito da escola etc.
Os pais têm o dever de prestar alimentos aos filhos. Os mesmo deveres (sustento).
O genitor não guardião tem por direito, visita aos filhos e mantê-los em sua companhia. Diminuindo o impacto do divórcio para a criança.
– Alimentos entre cônjuges – Fundamento jurídico no art. 1566, III
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
III – mútua assistência;
O cônjuge precisando, pode exigir que o outro contribua para sua assistência.
O cônjuge receberá em prol de suas necessidades e subsistência. Se o cônjuge for novo e jovem e tiver condições de retornar para o mercado de trabalho, o cônjuge receberá por um período, para que ele retorne ao mercado de trabalho. A doutrina e jurisprudência têm falado que o período razoável é de 2 anos para que possa retornar a mercado.
Se ocorrer (a inserção) antes dos 2 anos, pode ser dissolvido.
Filho é necessidade – possibilidade. Mas para cônjuge além da necessidade – possibilidade é para subsistência. Para cônjuge não se fala em manter o nível de vida. Somente para os filhos.
DIVÓRCIO:
Põe fim a sociedade conjugal e o vinculo. Novo estado civil – Divorciado.
A ação de divórcio é personalíssima e se extingue com a morte do requerente, mesmo pendente recurso para a instância superior. Já decidiu a propósito o Superior Tribunal de Justiça que, se ocorre o “falecimento do varão antes do trânsito em julgado da decisão que concedeu o divórcio, o estado civil do cônjuge sobrevivente é de viúva, não de divorciada”.
Aqui é possível a partilha, sem a necessidade de outra ação de partilha. É vinculada.
Acaba fidelidade, vida em comum em domicílio conjugal, dever de mútua assistência. Se não foram fixados os alimentos até o divórcio, não há possibilidade de pedir novamente. Visto que findou o dever de assistência. Na separação de fato, por exemplo, o dever de mútua assistência dura até 5 anos após. A guarda pode ser unilateral ou compartilhada. No mesmo instante que é decretada a guarda unilateral, nasce o direito de visita.
Divórcio Consensual – é aquele que há um acordo, comunhão de interesses. Conseguem, os ex-cônjuges, discutir todas as suas cláusulas. Possui comunhão de interesses (Acordo). Não há autor e réu. Não há necessidade de 2 advogados. Mais célere.
O Divórcio Litigioso, por sua vez, é aquele em que os cônjuges não conseguem chegar a um denominador comum, ambos os cônjuges têm interesses antagônicos, não conseguindo discutir as causas do divórcio e, por isso, a necessidade do Estado juiz escolher o que é melhor para eles.
O divórcio sempre será judicial. No litigioso, o Estado juiz que fará as escolhas.
Último instante para pleitear os alimentos.
No passado havia a forma indireta ou por conversão. Agora só existe a forma direta.
A forma indireta é aquele que passava pela separação judicial. Após 1 ano do trânsito em julgado da decisão da separação judicial, havia o direito de pleitear a separação judicial em divórcio. O divórcio era contado 1 ano da medida cautelar de separação de corpos e liminar de alimentos.
Com o desaparecimento do divórcio por conversão, provocado pela emenda constitucional 66/10, restaram três modalidades de divórcio: a) divórcio judicial litigioso; b) divórcio judicial consensual; e c) divórcio extrajudicial consensual.
O divórcio direto só era possível após separação de fato por 2 anos. A prova era feita através de testemunha.
O divórcio pode ser feito a qualquer tempo. Sendo indispensável testemunha, para provar o prazo.
Após a sentença do divórcio não é possível o restabelecimento do vínculo conjugal.
Alguns autores defendem que a separação judicial é permitida quando não há certeza do divórcio. Mas a maioria da doutrina defende que não há possibilidade de separação judicial.
Divórcio administrativo:
Mais célere, não há desgaste emocional e o custo é mais baixo. Não precisa levar ao judiciário, é um processo administrativo. Perante o oficial de Registro Civil. A mesma autoridade que vinculou o casamento será o que desvencilhar. Só há assinatura, não há necessidade de juiz. Lei 11441/07.
Requisitos para divórcio administrativo:
Consensual – Só cabe quando for consensual. Se for litigiosa, não pode ser administrativo. Visto que o oficial do registro civil não tem poder de decisão.
Patrimônio regular – Deve ser todo regularizado, não há possibilidade de falar de patrimônio em nome de 3º. Pode haver o divórcio administrativo, desde que a partilha seja feita por ação própria.
Filhos – maiores e capazes – Se houver filhos menores ou incapazes não pode haver o divórcio administrativo. Visto que o MP deve atuar como fiscal da lei.
1 Advogado – Mas continua precisando de advogado. Pode ter dois, mas um já é suficiente.
Oficial registro civil – A competência é relativa, de acordo com o interesse das partes. Averbação deve ser feita no cartório de origem.
Escritura pública – Da certidão de casamento. A escritura pública está para o divórcio administrativo assim como a sentença para a decisão judicial.
O Superior Tribunal de Justiça já vinha decidindo que o “divórcio direto pode ser concedido sem que haja prévia partilha dos bens” (Súmula 197).
A inovação constitucional impede a discussão sobre a culpa, uma vez que a ação de divórcio não a admite e a separação de direito deixou de existir. Poderá ela ser discutida, todavia, em ação indenizatória por danos materiais e morais, de um cônjuge contra o outro, uma vez que a culpa é elemento da responsabilidade civil. Poderá ser discutida, também, nas hipóteses de anulabilidade do casamento por vícios da manifestação da vontade aplicáveis ao casamento, como a coação e o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge. Nesses casos, a culpa importará na perda das vantagens havidas do cônjuge inocente e no cumprimento das promessas feitas no pacto antenupcial (CC, art. 1.564).

EFICÁCIA E DEVERES DO CASAMENTO

O casamento traz para os cônjuges a condição de consortes (art. 1.565 CC).
A vontade de um não ultrapassa a vontade do outro. Em caso de divergência quem decide é o juiz. – Trata-se de diretriz constitucional e do novo código civil que estabelece o poder familiar em detrimento do pátrio poder.
Art. 1.567. A direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos.
Parágrafo único. Havendo divergência, qualquer dos cônjuges poderá recorrer ao juiz, que decidirá tendo em consideração aqueles interesses.
Na despesa familiar, os custos devem ser proporcionais a arrecadação do cônjuge.
Os alimentos, em caso de dissolução ou para os filhos, serão proporcionais a possibilidade de cada consorte.
Art. 1.568. Os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e a educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial.
Ainda que se tenha a equivocada noção de que a “qualidade de vida” dos cônjuges deve ser mantida no mesmo nível, deve-se atentar para a observância de que a fixação dos alimentos deve, sempre, ser fixada de acordo com a arrecadação dos cônjuges.
Deveres do casamento:
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I – fidelidade recíproca;
A fidelidade não é só física, pode ser fidelidade virtual ou de pensamento.
O dever de fidelidade recíproca é uma decorrência do caráter monogâmico do casamento. É dever de conteúdo negativo, pois exige uma abstenção de conduta, enquanto os demais deveres reclamam comportamentos positivos. A infração a esse dever, imposto a ambos os cônjuges, configura o adultério, indicando a falência da moral familiar, além de agravar a honra do outro cônjuge. Se extrapolar a normalidade genérica, pode ensejar indenização por dano moral.
II – vida em comum, no domicílio conjugal;
A vida em comum, no domicílio conjugal, ou dever de coabitação, obriga os cônjuges a viver sob o mesmo teto e a ter uma comunhão de vidas. Essa obrigação não deve ser encarada como absoluta, pois uma impossibilidade física ou mesmo moral pode justificar o seu não cumprimento. Assim, um dos cônjuges pode ter necessidade de se ausentar do lar por longos períodos em razão de sua profissão, ou mesmo de doença, sem que isso signifique quebra do dever de vida em comum (art. 1.569).
III – mútua assistência;
O dever de mútua assistência obriga os cônjuges a se auxiliarem reciprocamente, em todos os níveis. Assim, inclui a recíproca prestação de socorro material, como também a assistência moral e espiritual. Envolve o desvelo próprio do companheirismo e o auxílio mútuo em qualquer circunstância, especialmente nas situações adversas.
Na raiz de todos esses sentimentos, assinala Caio Mário, “pode-se pesquisar a affectio maritalis, tão encarecida pelos romanistas. Em verdade formam a identidade fisiopsíquica dos cônjuges, que o Direito Canônico tão bem exprime dizendo-os uma só carne ou um só corpo — caro una, e que o direito moderno enaltece apresentando o matrimônio na sua configuração de unidade moral e econômica”.
O dever de assistência fundamenta o alimento na dissolução conjugal.
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
Os filhos não são mais o objetivo do casamento, é possível um casamento, ainda que não advenha a prole.
O sustento e a educação dos filhos constituem deveres de ambos os cônjuges. A guarda é, ao mesmo tempo, dever e direito dos pais. A infração ao dever em epígrafe sujeita o infrator à perda do poder familiar e constitui fundamento para ação de alimentos.
Subsiste a obrigação de sustentar os filhos menores e dar-lhes orientação moral e educacional mesmo após a dissolução da sociedade conjugal, até eles atingirem a maioridade. A jurisprudência, no entanto, tem estendido essa obrigação até a obtenção do diploma universitário, no caso de filhos estudantes que não dispõem de meios para pagar as mensalidades.
O dever de sustento ou de prover à subsistência material dos filhos compreende o fornecimento de alimentação, vestuário, habitação, medicamentos e tudo mais que seja necessário à sua sobrevivência; o de fornecer educação abrange a instrução básica e complementar, na conformidade das condições sociais e econômicas dos pais; e o de guarda obriga à assistência material, moral e espiritual, conferindo ao detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive pais.
V – respeito e consideração mútuos.
O respeito e a consideração mútuos constituem corolário do princípio esculpido no art. 1.511 do Código Civil, segundo o qual o casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. Tem relação com o aspecto espiritual do casamento e com o companheirismo que nele deve existir.
O dever ora em estudo inspira-se na dignidade da pessoa humana, que não é um simples valor moral, mas um valor jurídico, tutelado no art. 1º, III, da Constituição Federal. O respeito à honra e à dignidade da pessoa impede que se atribuam fatos e qualificações ofensivas e humilhantes aos cônjuges, um ao outro, tendo em vista a condição de consortes e companheiros de uma comunhão plena de vida.

ERRO ESSENCIAL E CULPA

Erro essencial
É uma possibilidade de anulação do casamento, decorrente do engano quanto a pessoa do cônjuge.
Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.
Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:
I – o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II – a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;
III – a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;
IV – a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.
O erro essencial quanto a pessoa do cônjuge possui o prazo de 3 anos para a anulação ser pleiteada.
Art. 1560, III
Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da data da celebração, é de:
III – três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557;
O erro deve ser tal que torne a vida em comum insuportável, e se o cônjuge tivesse consciência não teria casado. Para haver anulação faz-se mister que tais fatos tenham existência anterior ao casamento e que a sua descoberta, após o matrimônio, haja tornado insuportável a vida em comum. A apreciação far-se-á em cada caso, tendo em vista as condições subjetivas do cônjuge enganado e outras circunstâncias que evidenciem a insuportabilidade da vida em comum após a descoberta do defeito.
Mais comum é o erro sobre a identidade civil do outro cônjuge, sua honra e boa fama. Identidade civil é o conjunto de atributos ou qualidades com que a pessoa se apresenta no meio social. Algumas pessoas são tidas como trabalhadoras, honestas, probas; outras, porém, como inidôneas, desqualificadas etc.
O erro sobre a identidade civil se manifesta como causa de anulação do casamento “quando alguém descobre, em seu consorte, após a boda, algum atributo inesperado e inadmitido, alguma qualidade repulsiva, capaz de, ante seus olhos, transformar-lhe a personalidade, fazê-lo pessoa diferente daquela querida. É nesse conceito de identidade civil que se alarga o arbítrio do juiz. Porque nele caberá qualquer espécie de engano sério sobre a qualidade do outro cônjuge e estará porventura caracterizado o erro referente à pessoa”.
Nessa trilha, os tribunais têm concedido a anulação do casamento quando: a mulher descobre ter desposado cônjuge toxicômano, sendo tal circunstância apta a inviabilizar o projeto de convivência sustentável em padrões naturais ou aceitáveis de coabitação; o cônjuge varão contrai núp­cias com a mulher em razão de sua gravidez e vem a descobrir posteriormente que o filho pertence a terceiro, anulando-se o casamento independentemente de a esposa ter ou não agido dolosamente; o réu está envolvido com prática de ilícitos penais e age de modo zombeteiro em relação à esposa, demonstrando desvio de comportamento; a mulher mantém relações sexuais anômalas, confessando a prática de lesbianismo; o marido ignorava que a esposa se encontrava apaixonada por outro indivíduo, dando–se conta disso somente na lua de mel, quando passou a ser rejeitado sexualmente; a mulher se recusa ao pagamento do débito conjugal; o relacionamento sexual do casal é anormal, por falta de libido do marido em relação à esposa, sendo o quadro patológico e de difícil solução clínica; o marido exercia a profissão de odontólogo e, após o casamento, transforma-se em outra pessoa, dedicando-se ao misticismo e deixando de manter contato sexual com a mulher etc.
Culpa – muda o que está previsto no CC.
Está enraizada no CC/16. Aquele cônjuge que teve culpa na dissolução do casamento martiriza o supostamente culpado, visto que não há direitos na separação.
Art. 1.564. Quando o casamento for anulado por culpa de um dos cônjuges, este incorrerá:
I – na perda de todas as vantagens havidas do cônjuge inocente;
II – na obrigação de cumprir as promessas que lhe fez no contrato antenupcial.
Esse artigo não é mais aceito pela doutrina e jurisprudência, não se pode utilizar a lei para satisfazer sentimentos mesquinhos, tais como: ódio, vingança e punição.
O novo direito de família não se pensa mais em quem é o culpado, trata-se de uma dissolução sem ter um culpado.
Não gera efeito jurídico a culpa do fim do casamento, tanto para a prole quanto para o quinhão.

PROVAS DO CASAMENTO

Art. 1.543. O casamento celebrado no Brasil prova-se pela certidão do registro.
Parágrafo único. Justificada a falta ou perda do registro civil, é admissível qualquer outra espécie de prova.
O casamento se prova pela certidão de registro. Não a existindo, prova-se por qualquer meio permitido em direito. Se houver dúvida no processo judicial quanto ao estado de casado, decide-se pelo casamento. In dúbio pro casamento.
Art. 1.547. Na dúvida entre as provas favoráveis e contrárias, julgar-se-á pelo casamento, se os cônjuges, cujo casamento se impugna, viverem ou tiverem vivido na posse do estado de casados.
Já se procurou sustentar, sublinha Pontes de Miranda, que, “na justificação, basta que as testemunhas deponham que ouviram as declarações dos nubentes de estarem no propósito de casar, por livre e espontânea vontade, porque, acrescentou-se, proferida essa afirmação por ambos os nubentes, o casamento está realizado. De modo nenhum: a prova que se tem de dar é a de ter havido o registro civil, sem o qual o casamento não teve publicidade. Por isso mesmo, diz o art. 202, parágrafo único (do CC/1916), que, ‘justificada a falta ou perda do registro civil, é admissível qualquer outra espécie de prova’. A prova é para suprir a falta, ou perda, do registro civil, porque só o registro civil prova a existência do casamento”.
É ação declaratório meio hábil para confirmar a existência do casamento se perdido ou extraviado o registro do matrimonio, não se exigindo a restauração. A transcrição do julgado produzirá todos os efeitos civis desde a data da celebração.
Casamento no estrangeiro
Art. 1.544. O casamento de brasileiro, celebrado no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros, deverá ser registrado em cento e oitenta dias, a contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do respectivo domicílio, ou, em sua falta, no 1º Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir.
Cento e oitenta dias, no cartório do domicílio ou 1º Ofício da Capital.
Se não houver o devido registro aqui no Brasil, ele poderá casar novamente.
Prova-se o casamento celebrado fora do Brasil de acordo com a lei do país onde se celebrou. Trata-se de aplicação do princípio locus regit actum, acolhido no art. 7º da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, segundo o qual a lei do país onde está domiciliada a pessoa determina as regras gerais sobre direito de família.
O documento estrangeiro deverá ser autenticado, segundo as leis consulares, para produzir efeitos no Brasil. Exige-se-lhe a legalização pelo cônsul brasileiro do lugar. Se, porém, foi contraído perante agente consular, provar-se-á o casamento por certidão do assento no registro do consulado.
O cidadão brasileiro que resida no exterior pode optar por se casar pela lei brasileira, perante a autoridade consular, ou simplesmente conforme a lei estrangeira. Para a validade no Brasil, vindo o casal estrangeiro a fixar residência em nosso país, será necessário o registro da certidão do casamento realizado fora, com a devida tradução e a autenticação pelo agente consular brasileiro, conforme dispõe a Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015/73, art. 32).
Outras disciplinas relativas às provas do casamento no Código Civil.
Art. 1.545. O casamento de pessoas que, na posse do estado de casadas, não possam manifestar vontade, ou tenham falecido, não se pode contestar em prejuízo da prole comum, salvo mediante certidão do Registro Civil que prove que já era casada alguma delas, quando contraiu o casamento impugnado.
Posse do estado de casados: é a situação de duas pessoas que vivem como casadas (more uxorio) e assim são consideradas por todos. É, em suma, a situação de duas pessoas que vivem publicamente como marido e mulher e assim são reconhecidas pela sociedade.
Tal situação somente poderá ser alegada pelos filhos e se mortos ambos os cônjuges. É que, se um deles está vivo, deve indicar o local onde se realizou o casamento, para que os filhos obtenham a certidão. O dispositivo em apreço admite também a referida prova, mas pelos filhos de pais ainda vivos, e se estes se encontrarem impossibilitados de manifestar vontade, quando, por exemplo, perderam as faculdades mentais, encontra-se em estado de coma ou foram declarados ausentes por sentença judicial.
Tal modus vivendi, em regra, não constitui meio de prova do casamento, a não ser excepcionalmente, em benefício da prole comum (art. 1.545), e nas hipóteses em que ele é impugnado e a prova mostra-se dúbia, funcionando nesse último caso como elemento favorável à sua existência (art. 1.547).
Os elementos que caracterizam a posse do estado de casados são: a) nomen, indicativo de que a mulher usava o nome do marido; b) tractatus, de que se tratavam publicamente como marido e mulher; c) fama, de que gozavam da reputação de pessoas casadas.
A rigor, a posse do estado de casados não constitui prova das justas núpcias, visto não se admitir presunção de casamento. Em regra, a posse do estado de casados somente pode ser invocada como prova do casamento em caráter de exceção, para sanar qualquer falha no respectivo assento ou para beneficiar a prole.
Adverte Silvio Rodrigues que a finalidade da exceção é proteger a prole comum. Portanto, “se o ascendente de um dos pretensos cônjuges, para dele herdar, pretende provar o casamento, não pode, com fundamento nesse dispositivo (CC, art. 1.545), recorrer à posse do estado de casado, pois essa situação só é alegável tendo em vista evitar prejuízo à prole”.
– Portanto, o principal objetivo do artigo é disciplinar que a prova de casamento através da “posse do estado de casado” só poderá ser arguida em benefício da prole comum, nunca para prejudicá-la.
– Prova por sentença no livro do Registro Civil
Art. 1.546. Quando a prova da celebração legal do casamento resultar de processo judicial, o registro da sentença no livro do Registro Civil produzirá, tanto no que toca aos cônjuges como no que respeita aos filhos, todos os efeitos civis desde a data do casamento.
Os efeitos do casamento, in casu, operam desde a data da celebração, e não apenas a partir do registro. A regra já constava do art. 205 do Código Civil de 1916 e tinha mais importância antes da vigência da atual Constituição Federal, que estabelece a igualdade entre todos os filhos (art. 227, § 6º). Anteriormente, a retroatividade beneficiava os filhos já nascidos, que eram considerados legítimos desde a data da celebração do casamento.
O dispositivo em apreço trata das hipóteses em que, diante das dificuldades encontradas para provar a existência do matrimônio, recorrem os cônjuges ao processo judicial. A ação declaratória se mostra adequada para esse mister. A sentença deve ser inscrita no Registro Civil, com efeito retro-operante à data do casamento.

CELEBRAÇÃO DO CASAMENTO

– Celebração:
A celebração é o momento no qual exercerão o direito de manifestar a vontade de contrair o casamento.
Trata-se do último momento de oposição dos impedimentos do casamento. Até o momento da realização da solenidade há, portanto, a possibilidade de se apontar o impedimento, diferentemente do que sucede no tocante às causas suspensivas, cuja oposição se submete ao prazo de publicação dos editais de habilitação.
Art. 1.522. Os impedimentos podem ser opostos, até o momento da celebração do casamento, por qualquer pessoa capaz.
Parágrafo único. Se o juiz, ou o oficial de registro, tiver conhecimento da existência de algum impedimento, será obrigado a declará-lo.
Preceitua, com efeito, o art. 1.529 do Código Civil que os impedimentos “serão opostos em declaração escrita e assinada, instruída com as provas do fato alegado, ou com a indicação do lugar onde possam ser obtidas”. Acrescenta o art. 1.530 que o oficial do registro civil “dará aos nubentes ou a seus representantes nota da oposição, indicando os fundamentos, as provas e o nome de quem a ofereceu”.
Trata-se de negócio jurídico solene, e possui incidência direta de diversas normas de ordem pública.
A celebração do casamento sem o atendimento dos rigores da lei torna inexistente o ato, salvo casos excepcionais de dispensa, no casamento nuncupativo e na conversão da união estável em casamento.
Local e data serão estipulados para a celebração. No tocante à hora, pode o casamento ser realizado durante o dia ou à noite, e em qualquer dia, inclusive aos domingos e feriados, contanto que a celebração não ocorra de madrugada ou em altas horas noturnas — o que dificultaria a presença de pessoas que pretendessem oferecer impugnações.
A celebração é pública, qualquer pessoa nela pode adentrar. Qualquer lugar que for realizado o casamento deve estar de portas abertas. Pode ser celebrada em qualquer edifício público ou particular. (Art. 1.534)
No registro civil – 2 testemunhas
Edifício particular – 4 testemunhas.
“Quando o casamento for em edifício particular, ficará este de portas abertas durante o ato” (CC, art. 1.534, § 1º).
As testemunhas poderão ser parentes ou não.
Se houver qualquer tipo de dúvida quanto a aceitação de um dos cônjuges, a autoridade deverá suspender a celebração e só poderá haver retratação em outro dia.
É o momento de falar não, desta forma, não cabe indenização de dano moral (Entendimento STJ).
– Casamento por procuração – é admitido pelo ordenamento jurídico brasileiro. Pode ser representado em todo processo. Tem que ser por instrumento público, poderes especiais para casar. Por se revestir de natureza especial deve observar todos os requisitos estabelecidos na lei.
A procuração poderá ser revogada a qualquer tempo até o momento da celebração.
Deve ser feita (a revogação) pela mesma forma que ela surgiu (instrumento público). Muito importante que conste data e horário. Não é necessária a ciência do procurador, não precisa chegar ao seu conhecimento para que tenha efeito (§1º, 1ª parte).
Caso a revogação seja de boa-fé não há possibilidade de dano moral, por outro lado, comprovada má-fé, vislumbra-se tal possibilidade (§1º, 2ª parte).
Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração, por instrumento público, com poderes especiais.
·         1º A revogação do mandato não necessita chegar ao conhecimento do mandatário; mas, celebrado o casamento sem que o mandatário ou o outro contraente tivessem ciência da revogação, responderá o mandante por perdas e danos.
·         3º A eficácia do mandato não ultrapassará noventa dias.
·         4º Só por instrumento público se poderá revogar o mandato.
– Casamento putativo – É aquele que aparentava apresentar todos os requisitos da lei. Produz todos os efeitos jurídicos até a declaração de sua putatividade. Ex: autoridade incompetente.
A eficácia da decisão que reconhece o vício ou nulidade manifesta-se ex nunc, sem retroatividade, e não ex tunc, não afetando os direitos até então adquiridos. Essa situação faz com que o casamento putativo assemelhe-se à dissolução do matrimônio pelo divórcio. Os efeitos do casamento cessam para o futuro, sendo considerados produzidos todos os efeitos que se tenham verificado até a data da sentença anulatória. Enquanto pendentes os recursos eventualmente interpostos, permanecem os efeitos do casamento, como se válido fosse, em virtude do princípio segundo o qual não há casamento nulo nem anulado antes do trânsito em julgado da sentença.
Se algum dos nubentes estiver de má-fé, não se produzirão, para ele, os efeitos do casamento.
Ex: se um dos cônjuges sabia do vício que tornava o casamento irregular.
Casamento putativo, segundo se depreende do art. 1.561 do Código Civil, é o que, embora “anulável ou mesmo nulo”, foi contraído de “boa-fé” por um ou por ambos os cônjuges. Boa-fé, no caso, significa ignorância da existência de impedimentos dirimentes à união conjugal.
A ignorância da existência de impedimentos decorre de erro, que tanto pode ser de fato (irmãos que ignoram a existência do parentesco, p. ex.) como de direito (tios e sobrinhos que ignoram a necessidade do exame pré-nupcial, v. g.). Muito embora o erro de direito seja inescusável, em geral, por força do art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil, pode, todavia, ser invocado para justificar a boa-fé, sem que com isso se pretenda o descumprimento da lei, pois o casamento será, de qualquer modo, declarado nulo. Para o reconhecimento da putatividade não é necessário demonstrar nenhum outro elemento além da boa-fé, nem a escusabilidade do erro em que teria o nubente incorrido.
·         Casamento nuncupativo – É aquele em que um dos nubentes está em iminente risco de vida. Dispensa o oficial de registro civil ou qualquer autoridade celebrante. São necessárias 6 testemunhas – não pode ser parente até 2º colateral.
Art. 1.540. Quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo a presença da autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em linha reta, ou, na colateral, até segundo grau.
Iminente risco de vida, mas precisa estar em condições de entender o ato e manifestar a sua vontade.
Art. 1.541. Realizado o casamento, devem as testemunhas comparecer perante a autoridade judicial mais próxima, dentro em dez dias, pedindo que lhes tome por termo a declaração de:
I – que foram convocadas por parte do enfermo;
II – que este parecia em perigo de vida, mas em seu juízo;
III – que, em sua presença, declararam os contraentes, livre e espontaneamente, receber-se por marido e mulher.
Depende de suprimento judicial, desta forma o regime de bens será obrigatório do artigo 1.641 do Código Civil.
A Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015, de 31-12-1973) dispõe sobre as formalidades relativas ao casamento nuncupativo no art. 76 e seus parágrafos.
Até 10 dias deve ser levado ao Cartório de Registros Públicos.
O enfermo não pode ser representado no seu ato.
Se o enfermo convalescer, ele deve validar o ato e se puder passar por todo o procedimento.
·          Casamento por moléstia grave – Aquela doença diagnosticada pela medicina, não vai haver os benefícios do nuncupativo, mas terá prioridade. (Art. 1539)
Art. 1.539. No caso de moléstia grave de um dos nubentes, o presidente do ato irá celebrá-lo onde se encontrar o impedido, sendo urgente, ainda que à noite, perante duas testemunhas que saibam ler e escrever.
·         1º A falta ou impedimento da autoridade competente para presidir o casamento suprir-se-á por qualquer dos seus substitutos legais, e a do oficial do Registro Civil por outro ad hoc, nomeado pelo presidente do ato.
·         2º O termo avulso, lavrado pelo oficial ad hoc, será registrado no respectivo registro dentro em cinco dias, perante duas testemunhas, ficando arquivado.
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Publicidade, nulidades e causas suspensivas do casamento

Por se revestir de interesse público, é necessário que ao casamento seja conferida a devida publicidade.
Nestes termos, um dos principais objetivos é que o casamento não ocorra sem a observância do disposto no artigo 1.521 do Código Civil.
O momento de oposição dos impedimentos é até a celebração.
Art. 1.521. Não podem casar:
I – os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
II – os afins em linha reta;
III – o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
IV – os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;
V – o adotado com o filho do adotante;
VI – as pessoas casadas;
VII – o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.
O inciso I ao V trata das relações de parentesco.
O inciso VI trata, especificamente, das pessoas casadas e tem o fulcro de evitar a bigamia, proibida no direito brasileiro.
O inciso VII é denominado pela doutrina de “casamento troféu”, ou seja, é impedido ao cônjuge casar-se com o sujeito condenado por homicídio ou tentativa contra o seu consorte.
Linha reta ou 3º colateral:
A doutrina e jurisprudência permitem que 3º colateral se case desde que se faça exame e constate que não vai haver prejuízo para prole.
– É importante a análise das causas suspensivas do casamento, previstas no artigo 1523 do Código Civil e tem o objetivo de evitar confusões patrimoniais.
Art. 1.523. Não devem casar:
– o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;
II – a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;
III – o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;
IV – o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas.
Parágrafo único. É permitido aos nubentes solicitar ao juiz que não lhes sejam aplicadas as causas suspensivas previstas nos incisos I, III e IV deste artigo, provando-se a inexistência de prejuízo, respectivamente, para o herdeiro, para o ex-cônjuge e para a pessoa tutelada ou curatelada; no caso do inciso II, a nubente deverá provar nascimento de filho, ou inexistência de gravidez, na fluência do prazo.
As pessoas que casam e estão sob a disciplina do art. 1523 não têm direito de escolher o regime de bens, sendo-lhe imposto, pela lei, o regime de separação obrigatória de bens. (1641, I).
Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
II – da pessoa maior de sessenta anos;
III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
Desta forma, a publicidade é utilizada, também, para que um casamento não seja celebrado nutrido de alguma dessas causas suspensivas.
Importante se atentar para a as nulidades previstas no artigo 1.557 e os PRAZOS para anulação do casamento do 1.560 do Código Civil.
Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:
I – o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II – a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;
III – a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;
IV – a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.
Art. 1.558. É anulável o casamento em virtude de coação, quando o consentimento de um ou de ambos os cônjuges houver sido captado mediante fundado temor de mal considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares.
Art. 1.559. Somente o cônjuge que incidiu em erro, ou sofreu coação, pode demandar a anulação do casamento; mas a coabitação, havendo ciência do vício, valida o ato, ressalvadas as hipóteses dos incisos III e IV do art. 1.557.
Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da data da celebração, é de:
I – cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do art. 1.550;
II – dois anos, se incompetente a autoridade celebrante;
III – três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557;
IV – quatro anos, se houver coação.
·         1º Extingue-se, em cento e oitenta dias, o direito de anular o casamento dos menores de dezesseis anos, contado o prazo para o menor do dia em que perfez essa idade; e da data do casamento, para seus representantes legais ou ascendentes.

·         2º Na hipótese do inciso V do art. 1.550, o prazo para anulação do casamento é de cento e oitenta dias, a partir da data em que o mandante tiver conhecimento da celebração.