PRINCÍPIOS DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
O Direito Previdenciário é
uma área do Direito de tutela normativa relacionada à Previdência, sua
regulamentação e o acesso a benefícios. O Direito Previdenciário é um dos
direitos sociais elencados no art. 6º da Constituição Federal de 1988.
Apresentam-se, então, os princípios de direito
previdenciário, que podem ser evocados pelos advogados e que devem embasar a
prática previdenciária.
1. O QUE É O DIREITO PREVIDENCIÁRIO?
O direito previdenciário em resumo, como o próprio
nome revela, refere-se à área do Direito de
tutela normativa relacionada à Previdência.
Pela redação do art. 6º, CF/88, ainda,
extrai-se que o direito previdenciário se refere a um direito social. Desse
modo é a redação do dispositivo:
Art. 6º São direitos sociais a
educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer,
a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a
assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Dentro das gerações de direitos fundamentais,
portanto, estaria incluso dentro daqueles direitos da segunda geração. Ou seja,
direitos provenientes, sobretudo, de demandas sociais. E que, ainda,
representam assimilações e positivações de direitos humanos.
Como uma área do Direito, possui princípios
próprios, além de regulação por legislações específicas, como se vislumbrará
abaixo.
Por fim, engloba uma parte da seguridade
social, prevista na Constituição Federal, em seu artigo 194.
Acerca do tema, Marisa Ferreira dos
Santos [1] escreve que a
evolução da seguridade social decorre da existência de desigualdades em meio à
sociedade. As diferenças socioeconômicas, contudo, não são apenas problemas
individuais. Pelo contrário, são também problemas sociais.
E seguindo também esse entendimento, a constituinte
de 1988 especificou que a Previdência e a própria seguridade social serão
financiadas pela sociedade, de modo direto ou indireto, integrando o orçamento
público. Mas este financiamento, por óbvio, será revertido à própria sociedade
através das políticas públicas e da efetivação de direitos.
2. O QUE É O SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL?
A seguridade social, portanto, é um
dever do Estado na promoção de direitos sociais devidos a todos os cidadãos. É,
assim, um meio de de proporcionar o bem estar social e efetivar direitos
fundamentais. E como observado, dela decorre o direito
previdenciário.
O art. 194, CF, dispõe,
então:
Art. 194. A seguridade social
compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e
da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público,
nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes
objetivos:
I.
universalidade
da cobertura e do atendimento;
II.
uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
III.
seletividade e
distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV.
irredutibilidade
do valor dos benefícios;
V.
equidade na
forma de participação no custeio;
VI.
diversidade da
base de financiamento;
VII.
caráter
democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite,
com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do
Governo nos órgãos colegiados.
Segundo Santos [2], a evolução
histórica da seguridade social, ainda, pode ser dividida em três principais
etapas:
1.
assistência pública – relativa,
principalmente, a ações de caridade, as quais inicialmente não eram realizadas
por instituições públicas;
2.
seguro social – institucionalização de garantias, mediante
a comprovação da necessidade do indivíduo;
3.
seguridade social – sistematização de proteções sociais capazes de
alcançar necessidade individuais diversas e abrangentes.
Na etapa da seguridade social, portanto, o Estado
fornece benefícios, em regra pecuniários, para suprir as necessidades dos
indivíduos. E garantir, assim, a dignidade da vida humana.
3. O QUE É A LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA?
A legislação de direito previdenciário refere-se às
leis esparsas que regulamentam as normas gerais da Constituição Federal. Tal
qual observado no histórico da seguridade social, a princípio não havia
normatização do direito previdenciário. Portanto, a legislação previdenciária é
uma conquista histórica
Já na Constituição Imperial de 1824, houve avanços
incipientes na regulamentação de um projeto de seguridade social. No entanto, o
marco da legislação previdenciária é considerado a Lei Eloy Chaves (LEC ou
Decreto Legislativo 4.682/1923), de 1923. A lei estabelecia, então, direitos
referentes aos trabalhadores ferroviários. Previa, por exemplo, a necessidade
de uma Caixa de Aposentadoria por parte das empresas ferroviárias.
Em 1960, então, foi publicada a Lei Orgânica da
Previdência Social (Lei 3.807/60), ainda em vigor. E em 1990 foi criado o INSS,
uma das principais instituições dentro do direito previdenciário.
Entre as principais leis previdenciárias,
pode-se citar:
- Lei 8.213/91 –
acerca dos benefícios da previdência social;
- Lei 8.742/93 – acerca da prestação contínua da
assistência social;
- Lei 12.101/2009 – acerca das entidades
beneficentes de assistência social;
4. QUAIS OS PRINCÍPIOS DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO?
Assim como o direito penal e o direito civil
possuem princípios próprios, o direito previdenciário também possui alguns.
Trata-se, portanto, de conceitos e preceitos basilares para a constituição
dessa área jurídica. Desse modo, impactam na legislação previdenciária e na
aplicação dos direitos dela decorrentes.
São alguns dos princípios
do direito previdenciário:
1.
dignidade humana;
2.
solidariedade social;
3.
equilíbrio econômico;
4.
vedação do retrocesso; e
5.
proteção ao hipossuficiente.
Analisa-se, então, cada um desses princípios.
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA
A dignidade humana é um dos grandes princípios do
Direito brasileiro de modo geral. Afinal, é disposta já no art. 1º da
Constituição Federal. E é apresentada como dos fundamentos do Estado de
Direito. Portanto, não poderia deixar de integrar os princípios do direito
previdenciário. Isto, sobretudo, porque se trata de uma área cujo princípio
objetivo é a assistência às vidas humanas.
Apesar disso, é difícil conceituar o que seria a vida
digna. Então, costuma-se entender a dignidade da vida humana como o
preenchimento de condições básicas de existência e de integridade do ser
humano. Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal ressaltou no Recurso
Extraordinário 835558, de 2017:
[…] o núcleo
material elementar da dignidade humana ‘é composto do mínimo existencial,
locução que identifica o conjunto de bens e utilidades básicas para a
subsistência física e indispensável ao desfrute da própria liberdade. Aquém
daquele patamar, ainda quando haja sobrevivência, não há dignidade’.
Uma vez que, em decorrência das diferenças
socioeconômicas já ressaltadas, nem todos são capazes de garantir a sua
subsistência em conformidade ao princípio da dignidade humana, surge o dever de
proteção do Estado. Por isso, então, a existência de legislações
previdenciárias.
O sistema de seguridade social é, por exemplo, uma
dessas medidas de garantia dos direitos sociais. E é um direito de todos o
acesso eficaz a ele, quando seja necessário.
PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE SOCIAL
O princípio da solidariedade social talvez seja o
que mais traduz o direito previdenciário. Ele orienta todas as medidas de
proteção do Estado, mas também o dever coletivo da sociedade de financiar,
direta ou indiretamente, a seguridade social, disposto na Constituição Federal.
É portanto, o principio que caracteriza e baseia o principal objetivo do
direito previdenciário. Por óbvio, deve atuar conforme o princípio da
dignidade humana. No entanto, é ele que fortalece os deveres já mencionados.
Por contribuição direta, quer-se falar do pagamento
direto, como as contribuições ao INSS. Já por pagamento indireto, quer-se falar
da parte dos impostos arrecadados que é destinada à Previdência Social.
Ressalta-se que essa destinação é definida pelo orçamento público. Assim,
garante-se o acesso e atendimento dos cidadãos aos benefícios da Seguridade
Social.
PRINCÍPIO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO
Apesar das intenções de manutenção da existência
digna através da solidariedade social e da concessão de benefícios pecuniário,
é importante a consciência de que a verba utilizada para fins de direito
previdenciário parte de algum ponto. Como já mencionado, as receitas podem ser
provenientes tanto de contribuições diretas quanto da destinação de impostos
arrecadados. No entanto, devem ser condizentes com os valores comprometidos com
os benefícios concedidos.
Desse modo, o princípio do equilíbrio econômico faz
referência a balança entre os valores que são arrecadados e repassados à
Previdência e os valores que são revertidos em benefícios. Se não há
conformidade nessa diferença, pode haver um desequilíbrio econômico. E, assim,
culminar em um déficit da Previdência. Consequentemente, os principais afetados
serão aqueles que necessitam dos benefícios previdenciários. Isto porque os benefícios
poderão restar prejudicados.
Com base nisso, o art. 201 da Constituição
Federal dispõe:
Art. 201. A previdência social será organizada sob
a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória,
observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial […]
Portanto, é preciso que o orçamento público seja
capaz de manter esse equilíbrio a fim de suprir as contingências não apenas
imediatamente, mas também em um planejamento a longo prazo.
PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO AO HIPOSSUFICIENTE
Do mesmo modo que no direito consumerista, o
direito previdenciário possui como princípio a proteção ao hipossuficiente.
Afinal, a relação previdenciária se estabelece entre o indivíduo e o Estado. E,
de modo geral, o indivíduo que recorre à Previdência já necessita de um amparo
em função de suas condições socioeconômicas.
Colocá-los em patamares iguais, portanto, poderia
incorrer na violação aos princípios da dignidade humana e da solidariedade
social. E desse modo, as normas previdenciárias devem sempre ser interpretadas
a favor do menos favorecido.
PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO RETROCESSO
O princípio da vedação do retrocesso é bastante
conhecido no direito
trabalhista. No entanto, também está presente no direito
previdenciário. E relaciona-se bastante com o princípio vislumbrado da proteção
ao hipossuficiente. Isto porque prevê que os direitos concedidos não podem ser
retirados. E, contribui assim, para a proteção dos hipossuficientes.
Isto não significa, contudo, que alterações não
podem ser realizadas. Pelo contrário, o legislador pode modificar a legislação
previdenciária, sobretudo em face das modificações sociais e da conformidade ao
princípio do equilíbrio econômico. E, com base nisto, opera a Reforma da
Previdência, por exemplo.
O que resta vedado é a supressão de direitos e
garantias injustificadamente e sem compensação ou adequação a um contexto
geral. O direito previdenciário constitui-se com base na defesa de direitos
sociais e não pode ser modificado arbitrariamente. Do contrário, isto poderia
não apenas ferir a dignidade da pessoa humana, como também implicar em graves
problemas sociais.
Assim, é dever do Estado prezar por modificações
equilibradas e em conformidade ao demais princípios.
[1] SANTOS, Marisa
Ferreira dos. Direito previdenciário esquematizado. 3. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013.
[2] SANTOS, Marisa
Ferreira dos. Direito previdenciário esquematizado. 3. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013.