PROCEDIMENTO NO CRIME DE RESPONSABILIDADE E CRIMES COMUNS PRATICADOS
PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA
CRIMES DE RESPONSABILIDADE
Os crimes de responsabilidades são infrações político-administrativas,
definidas em lei especial federal, que poderão ser cometidas no desempenho da
função pública e que poderão resultar no impedimento para o exercício da função
pública (impeachment).
Historicamente, sob forte influência do modelo norte-americano,
previu-se os crimes de responsabilidade na Constituição de 1891, sendo regulamentados pelas Leis ns. 27 e 30, de 1892. Na atual Constituição Federal, o Art. 85 aponta as condutas do Presidente da República que caracterizarão
crime de responsabilidade, nos termos seguintes:
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da
República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do
Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV - a segurança interna do País;
V - a probidade na administração;
VI - a lei orçamentária;
VII - o cumprimento das leis e
das decisões judiciais.
Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que
estabelecerá as normas de processo e julgamento.
A competência para processar e julgar o Presidente da República nos
crimes de responsabilidade é do Senado Federal (art. 52, I, CF), após autorização da Câmara dos Deputados, por
dois terços (2/3) dos seus membros (art. 51, I, CF).
Determina a Constituição que, durante o processo de julgamento dos
crimes de responsabilidade pelo Senado Federal, funcionará como Presidente o do
Supremo Tribunal Federal (art. 52, parágrafo único). Sendo que na realidade o
Senado Federal não estará funcionando como órgão legislativo, mas sim como
órgão judicial híbrido, porque composto de senadores da República, mas
presidido por membro do Poder Judiciário.
Qualquer cidadão é parte
legítima para oferecer a acusação contra o Presidente da República à Câmara do
Deputados, pela prática de crime de responsabilidade. Essa prerrogativa é
privativa do cidadão, na qualidade de titular do direito de participar dos
negócios políticos do Estado, na prática, qualquer autoridade pública ou agente
político poderá fazê-lo, desde que na condição de cidadão.
Como se vê, o processo de impeachment tem início na
Câmara dos Deputados, a partir da apresentação da denúncia por qualquer
cidadão, pois cabe privativamente a essa Casa autorizar, por dois terços (2/3)
de seus membros, a instauração do processo contra o Presidente da República.
Admitida a acusação pela Câmara dos Deputados, o processo será
encaminhado ao Senado Federal, para julgamento. A admissão da acusação pela
Câmara dos Deputados vincula o Senado Federal, obrigando-o a dar início ao
procedimento para apuração do crime de responsabilidade, não sendo permitida ao
Senado Federal qualquer discricionariedade quanto à instauração, ou não, do
processo de impeachment, devendo assegurar ao processado, evidentemente,
integral direito ao contraditório e à ampla defesa.
No momento que é instaurado o processo de julgamento pelo Senado
Federal, o Presidente da República ficará suspenso de suas funções, somente
retornando ao exercício da Presidência se for absolvido ou se, decorrido o
prazo de cento e oitenta (180) dias, o julgamento não estiver concluído,
hipótese em que retornará ao exercício das suas funções, sem prejuízo do
regular prosseguimento do processo (CF, art. 86, § 1.º).
A condenação do Presidente da República pela prática de crime de
responsabilidade, que somente será proferida pelos votos de dois terços (2/3)
dos membros do Senado Federal, em votação nominal aberta, acarretará a perda do
cargo, com a inabilitação por oito (8) anos, para exercício de funções públicas,
sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis (CF, art. 52, parágrafo único).
A sentença será formalizada por
meio da expedição de uma Resolução do Senado Federal.
Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a renúncia ao
cargo, apresentada na sessão de julgamento, quando já iniciado este, não
paralisa o processo de impeachment. Ainda firmou entendimento de
que, apresentada a denúncia o Presidente da República estiver no exercício do
cargo, prosseguirá o julgamento, mesmo após o término do mandato. O STF ainda
deixou assente que o Poder Judiciário não dispõe de competência para alterar a
decisão proferida pelo Senado Federal no processo de impeachment.
CRIMES COMUNS
O Presidente da República dispõe de prerrogativas e imunidades em
relação ao processo que vise à sua incriminação pela prática de crime comum. As
regras procedimentais para o processamento dos crimes comuns estão previstas na
Lei n. 8.038/90 e nos arts. 230 a 246 do RISTF.
Da mesma forma como ocorre nos crimes de responsabilidade, também haverá
um controle político de admissibilidade, a ser realizado pela Câmara dos
Deputados, que autorizará ou não o recebimento da denúncia ou queixa-crime pelo
Supremo Tribunal Federal, através do voto de dois terços (2/3) de seus membros
(art. 86, caput, CF), pois bem, admitida a acusação, ele será
submetido a julgamento perante o STF.
A denúncia, nos casos de ação penal pública, será oferecida pelo
Procurador-Geral da República. Em caso de não ter formado sua opinio
delicti, deverá requerer o arquivamento do inquérito policial. Nos
casos de ação privada, haverá necessidade de oferta da queixa-crime pelo
ofendido, ou quem por lei detenha tal competência.
A expressão “crime comum”,
conforme posicionamento do Supremo Tribunal Federal, abrange “todas as
modalidades de infrações penais, estendendo-se aos delitos eleitorais,
alcançando até mesmo os crimes contra a vida e as próprias contravenções
penais.
Recebida a denúncia ou
queixa-crime, o Presidente da República ficará suspenso de suas funções por
cento e oitenta (180) dias, sendo que, decorrido tal prazo sem o julgamento,
voltará a exercê-las, devendo o processo continuar até a decisão final.
IMUNIDADES
A Constituição outorgou ao Presidente da República três
importantes imunidades processuais, examinadas a seguir:
1ª) Imunidade em relação ao processo diz respeito à necessidade de
autorização prévia da Câmara dos Deputados, por dois terços (2/3) dos seus
membros (art. 86, CF).
2ª) Imunidade em relação ao processo obsta que o Presidente da República
seja preso, nas infrações comuns, enquanto não sobrevier sentença condenatória
(art. 86, § 3º, CF). Essa imunidade impede que o Presidente da
República seja vítima de prisão em flagrante ou de qualquer outra espécie de
prisão cautelar (preventiva, provisória etc.), seja o crime afiançável ou
inafiançável. Enfim para que o Presidente da República seja recolhido à prisão,
é indispensável a existência de uma sentença condenatória, proferida pelo STF.
3ª) Imunidade processual outorga ao Presidente da República uma relativa
e temporária irresponsabilidade, na vigência do mandato, pela prática de atos
estranhos ao exercício de suas funções (art. 86, § 4º, CF).
Por força dessa última
imunidade do Presidente da República, que estabelece a sua irresponsabilidade
temporária quanto aos atos estranhos ao exercício do mandato, o chefe do
Executivo só poderá ser responsabilizado, na vigência do seu mandato, pela
prática de atos que guardem conexão com o exercício da atividade presidencial,
hipótese em que será processado e julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Se o
crime praticado não guardar conexão com o exercício das funções presidenciais,
o Presidente da República só poderá ser por ele responsabilizado após o término
do seu mandato, perante a justiça comum.
Essa imunidade, prevista no § 4º do art. 86 da Constituição, refere-se exclusivamente às infrações de natureza
penal, não impedindo a apuração, na vigência do seu mandato, da
responsabilidade civil, administrativa, fiscal ou tributária do Presidente da
República.
PRERROGATIVA DE FORO
O Presidente da República dispõe de prerrogativas de foro. Com efeito,
deferida a autorização da Câmara dos Deputados, por dois terços (2/3) dos seus
membros, será ele julgado, nos crimes de responsabilidade, pelo Senado Federal
e, nas infrações comuns, pelo Supremo Tribunal Federal (art. 86 da CF).
A competência do Supremo Tribunal Federal para julgar, originariamente,
o Presidente da República alcança todas as modalidades de infrações penais,
estendendo-se aos crimes eleitorais, aos crimes dolosos contra a vida e até
mesmo às contravenções penais. Acontece, porém, que a competência do STF para
julgar o Presidente da República só alcança dos crimes comuns por ele cometidos
na vigência do mandato e, ainda assim, desde que sejam ilícitos relacionados
com o exercício do mandato (in officio ou propter officium).
A prerrogativa de foro só diz
respeito a ações de natureza penal, não alcançando o julgamento de ações de
natureza civil eventualmente ajuizadas contra o Presidente da República, tais
como ações populares, ações civis públicas, ações possessórias etc. Ademais, a
prerrogativa de foro só permanece durante o exercício de mandato, não
subsistindo após a expiração deste.
Por fim, caso o Presidente da
República seja condenado pelo Supremo Tribunal Federal pela prática de crime
comum, a decisão condenatória com trânsito em julgado acarretará a suspensão
dos seus direitos políticos e, em consequência, a cessação imediata de seu
mandato.
REFERÊNCIAS:
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 15. Ed.
Rev. Atual. E amp. São Paulo: Saraiva, 2010.
PAULO, Vicente. ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional
descomplicado. 7. Ed. Rev. E atual. Rio de Janeiro: Método, 2011.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo:
Atlas.
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